Ambiguidades

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a-ambiguidade-se-caracteriza-como-um-desvio-em-se-tratando-linguagem-5126345718a7fQuem acompanha as posturas assumidas pela Igreja Romana neste século, certamente pode utilizar a palavra “ambigüidade” como resumo de seu comportamento. Com a morte do Papa João Paulo II em 2005, assume o papado o Cardeal alemão Joseph Ratzinger (Bento XVI), antigo Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé (antigo Santo Ofício), que renunciou em 2013 em meio a escândalos de corrupção e pedofilia por altos dignitários do alto clero, sendo substituído pelo Cardeal argentino Jorge Bergóglio (Francisco) digno de um carisma exemplar e de uma postura cristã de tolerância e respeito com o ser humano. Enquanto o papado de João Paulo II era extremamente conservador, mas bem relacionado com a mídia, Ratzinger – o grande mentor teológico por trás dos textos de João Paulo II, não teve a mesma sorte. Se com João Paulo II a imprensa ressaltava sua popularidade e suas posturas políticas conservadoras que tiveram uma forte influência na Polônia, por exemplo, por outro, era claro seu empenho em mudar os cardeais eleitores e os bispos mais liberais, por bispos e cardeais conservadores. Foi durante o pontificado de João Paulo II, por exemplo, que ocorreu a punição sobre o hoje ex-frei Leonardo Boff e, depois, o desmantelamento da Teologia da Libertação, tudo feito pelo Cardeal Joseph Ratzinger.

No pontificado do Papa Bento XVI temos uma realidade também ambígua. Indiscutivelmente Joseph Ratzinger era o maior teólogo romano do mundo e um exímio escritor. Mas sua relação com a mídia e com o povo era terrível. Sua dificuldade cresceu ainda mais porque seu papado coincide com a emergência de uma série de escândalos de pedofilia nos quatro cantos do mundo. A Igreja Romana entra na defensiva e faz o que ela sempre fez com os pedófilos: transfere de paróquias, de dioceses, ou de país como o famoso dito popular “Promover para Remover”.  Mas os problemas se agudizaram. De repente, além da pedofilia, aparecem outros problemas que acabam fazer com que o próprio Papa renuncie diante de sua incapacidade de mudar a triste realidade de uma igreja que acolhe em sua cúria, pedófilos, homossexuais, corruptos, fraudadores, carreiristas e pessoas insensíveis às dores concretas das pessoas. Eis que com a renúncia de Bento XVI elege-se Francisco, para poder com sua disciplina jesuítica e com sua postura mais humilde, reformar a Igreja Romana. Emblemática foi sua palestra sobre as 15 doenças que atingem a Cúria Romana. Ele revela como alguém que assume uma postura mais aberta com os problemas do mundo moderno. Todavia ainda precisamos lembrar que a Cúria continua a mesma da época de Bento XVI.

Como consequência a Igreja Romana continua cometendo, nas instâncias diocesanas, os mesmos erros que são condenados em instância pública. Ainda vemos padres pedófilos sendo transferidos de paróquia quando os escândalos acontecem, ou ganhando como prêmio para a remoção, estudos de mestrado e doutorado em Roma e outras universidades do exterior, para evitar o escândalo ou exploração midiática do fato. Entretanto se fosse nessa mesma situação um Pastor Protestante ou Evangélico, a Igreja Romana ajudaria a apedrejar junto à mídia impressa, televisiva ou virtual, se vangloriando de ser reacionária e defensora dos bons costumes, da família etc. Pura demagogia. Estranhamente, quando um padre resolve assumir sua relação com uma mulher sua punição é a suspensão de ordem. A impressão que temos é que relacionar-se com uma mulher é mais pecaminoso do que com um menor. Outros casos por parte de párocos sobre a não prestação de contas do dinheiro que entra, e do dinheiro que sai de suas igrejas, arrecadado com o suor do povo em dízimos, ofertas e quermesses, que ficam sem saber onde é investido, e como foi distribuído; como forma de transparência e de honestidade perante sua comunidade.

Creio que a Igreja Romana terá que enfrentar três grandes problemas neste tempo: admitir que o celibato obrigatório seja um absurdo natural, reconhecer que o uso de métodos contraceptivos é fundamental para o planejamento familiar e adequar-se em sua postura ecumênica verdadeira e não de fachada como é feita na atualidade. Para os romanos, somente a Igreja Católica Romana é “Igreja”, as demais Igrejas Cristãs para o alto-clero e para alguns autonomeados “vaticanólogos”, elas não passam de agremiações religiosas sendo chamadas nos documentos oficiais de “comunidades eclesiais”. Ora, qualquer indivíduo razoavelmente inteligente e que conheça história, saberá que o Evangelho só chegou a Roma depois de ter passado por toda Ásia menor e norte da África. Portanto, a primeira Sé cristã foi a de Jerusalém e depois a de Antioquia da Síria.

Os católicos romanos deveriam ser mais humildes porque com este telhado de vidro, não se pode jogar pedra na casa de ninguém. Como diria nosso Mestre e Senhor Jesus Cristo sabiamente para os fariseus, doutores da lei, e fanáticos de plantão no Evangelho segundo Mateus :E por que tu reparas no cisco que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho? Hipócrita, retire primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar o cisco do olho do teu irmão.” Mateus 7, 3-5.

* Reverendo Juliano Bernardino de Godoy- Reitor da Igreja Anglicana de São Jorge em Rio Claro –SP. (Graduado em História, Filosofia e Teologia com especialização em História Cultural, Ensino de Sociologia e Teologia Histórica)- e-mail: [email protected]

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