Aqui e não ali

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UnknownGosto de ligar meu computador desde que ele não me desligue da vida.

Rendo-me, acho incrivelmente genial que possamos nos comunicar instantaneamente com alguém do outro lado do planeta por emails e text messages, que meus pais possam brincar fazendo caras e caretas para meus filhos do outro lado do mundo pelo Skype, que possamos acessar um oceano de informações num piscar de olhos por sites de procura, que possamos adquirir músicas e filmes sem sair de casa pelo ITunes, que possamos saborear vídeos antigos no Youtube e fotografias pelo Instagram.

Tudo isto (e um mar de outras novidades que meu analfabetismo tecnológico me faz desconhecer) sem sombra de dúvida é fantástico e revolucionou o modo como vivemos.

Porém, sinto um grande desconforto com o que considero exageros, arestas pontiagudas deste mundo virtual.

Sou totalmente avessa, por exemplo, a ideia de crianças não mais brincarem nos quintais de nossa infância em troca de ficarem em frente a computadores jogando videogames horas a fio.

Ou a ideia de crianças em restaurantes, completamente alienadas com seus joguinhos em punho, perderem a oportunidade de apreender como socializarem, como aproveitarem um momento à mesa com a família ou amigos.

Sou avessa a substituírem livros por computadores. Ponto.

Sou avessa (até me provem o contrário) a ter coisas como meu nome ou de minha família expostos em redes sociais.

Qual o verdadeiro escopo disto?

Não tratar-se-ia de uma necessidade de expor-se desnecessária?

Por que tudo tem de ser tão público e notório hoje em dia?

Não podemos manter laços sim, comunicarmo-nos sim, mas sem escancararmos nossa privacidade? A pergunta fica.

*

Meses atrás li o artigo inaugural de Denise Fraga na Folha de São Paulo.

Em sua crônica ela contava que quando criança viajava para cima e para baixo no táxi de seu tio, um fusquinha verde-água, enquanto ora mantinha divertidas conversas com ele, ora escutava as conversas entre ele e seus passageiros, ora ouvia as notícias do rádio, ora dormia, acordava, ganhava balas e via a vida que ia correndo pela janela do táxi de seu tio.

Segundo suas palavras, ela era fã de seu tio pelo seu jeito de flanar pela vida. Conta ela que ele achava tudo divertido, adorava um bom papo e não via problema algum em coloca-la para participar de suas delícias.

Quando crescera, já tendo seu tio falecido, a artista contava ter mantido o hábito de entreter-se, de ainda deleitar-se com pequenos presentes oferecidos em corridas de táxi.

Tudo isso até o momento que passou a andar pendurada a seu celular, o qual, segundo suas palavras vão sorrateiramente nos roubando a plenitude, o simples estarmos num lugar sem achar que poderíamos estar em outro.

Denise terminara seu artigo lamentando que quando os taxistas de hoje chegam em casa, nem as poucas histórias advindas de parcas conversas tidas com os passageiros (hoje plugados a seus laptops ou celulares), podem contar a suas esposas porque estas estão em casa plugadas ao computador na frente do Facebook…

Cara Denise, faço coro a sua voz.

Acredito que o excesso de conexão virtual está nos desconectando da vida.

Também a mim, o real acontece aqui e agora.

A mim a maior conexão é com os livros que leio e que me tocam, com as trilhas por onde pedalo, com praias e montanhas por onde caminho, com os pores do sol que aprecio, com as músicas que ouço, com os países que visito, com as comidas que saboreio, com os mergulhos que dou, com os banhos de chuvas que tomo e com o fogo que olho em frente a lareira em um dia de inverno. A maior conexão é entre eu e meus filhos, entre eu e meu marido, entre eu e minha família, entre eu e meus amigos do peito.

A maior conexão é com a vida.

Mas, a vida real, que acontece bem aqui, sob nossos narizes.

Que possamos dar um tempo, desligando nossos smartphones, IPads, IPods, IPhones laptops ou seja lá o que for.

Que possamos nos desconectar para, de fato, nos conectarmos.

Que possamos voltar a viver o momento presente para que ele não nos escape pelos dedos deixando de ser exatamente isto que ele ainda, meio esfolado e cansado, continua tentado nos ser: um presente.

Obs. Esta época de festas pode ser uma ótima oportunidade para exercitarmos esta idéia. Desligue o tablet, ligue seu filho. Sente no chão com ele e aproveitem o dia juntos. Feliz Natal a todos

1 comentário

  1. Dania Gelli Checchinato em 12/12/2013 às 10:08

    Compartilho dos pensamentos da autora e coloco aqui apenas um breve relato, que parece bobo, mas me fez sentir o “tempo de se dedicar à vida que esta acontecendo, de carne e osso”.
    Do nada apareceu uma gata em nossa casa, “ela” resolveu nos adotar.
    Na nossa casa, anteriormente sem bichos domésticos, mudou-se a rotina. Mais uma vida para cuidar e se preocupar, mais trabalho e coisas para limpar ???!!! Não, definitivamente.
    Posso dizer que foi um bom motivo para sair da frente do computador e brincar com ela, com bola de papel amassada e amarrada à um barbante que meu filho fez; de vê-la ágil subindo, pulando, dando pinote e tentando caçar a bola; simplesmente dando-lhe a atenção que ela, a qual está vacinada contra o mundo virtual, me cobra sem ideia do bem que me faz.

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