ContraPonto: Lava PT

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O caso Cunha é o óbvio com sobras de provas materiais. Nada de “convicções” de procuradores e juízes.  Não prendê-lo vinha a dar argumentos aos críticos do juiz Sérgio Moro que o acusam de atuar apenas sobre o PT (principalmente nas proximidades de eleições). Assim, prender Eduardo Cunha nesse momento parece apropriado para os fins de propaganda de uma   Lava Jato imparcial. Concomitantemente, o que não causa estranheza é o afinado  discurso da Rede Globo(que sempre pareceu espetacularizar ações antipetistas)  de que a tese de perseguição somente ao PT  “vai por água abaixo”.

Cada vez mais, a sociedade brasileira vêm cobrando da Lava Jato ações contra políticos e membros de outros partidos – não somente do PT –  citados por delatores. Cobrança que também se faz ao Supremo Tribunal  Federal (STF) pela demora com que trata o tema em relação àqueles que gozam de foro privilegiado. Neste contexto,  parece claro o propósito de esvaziar o discurso de ‘Lava PT”. Discurso petista, sim,  mas também de toda sociedade vacinada por operações e retóricas diversas e sintonizadas.

Prender Eduardo Cunha já havia passado da hora, e estava pegando mal para a Lava Jato e para o juiz Sérgio Moro.

E a Globo com isto? – Para quem está acostumado com o que pode ser interpretado como propaganda de desconstrução de imagem do Partido dos Trabalhadores por parte de alguns grandes veículos de comunicação, não causa  surpresa os principais jornais do grupo Globo  (Tv Globo e Globo News) colocarem em seus noticiários – e repercutida de forma repetitiva e ininterrupta por meio de seus principais “comentaristas” políticos –  a tese de que  agora “vai por água abaixo” o discurso petista de que a Lava Jato só investiga delações quando há algum petista envolvido . Soa a claríssimo discurso ensaiado, com script bem definido e com fins específicos de convencer a opinião pública de que a reclamação dos membros do Partido dos Trabalhadores e de esclarecidos setores da sociedade não tem razão de ser; e que a operação da Polícia Federal e a atuação do juiz Sérgio Moro não é parcial.

Na contramão do que a realidade do dia-a-dia mostra, dá a impressão de que o objetivo da Globo é descaracterizar   a reclamação petista e da opinião pública. E por quê? Seria para evitar especulações sobre o não avanço das investigações sobre os demais partidos citados nas delações premiadas da Lava Jato e perpetuar a imagem do caráter imparcial da Lava Jato? Ou o quê?

Mesmo por muito óbvia a prisão de Eduardo Cunha, a Lava Jato passa a imagem de cumprimento de seu papel e ao mesmo tempo  a impressão de jogar para a torcida; a dar  cala boca aos críticos e fortalecer a sua  imagem de imparcialidade; de caça a corruptos de todos os partidos –  o que é fortemente questionado pela opinião pública. “Por que Moro não investiga figurões do DEM?; do PSDB, como Fernando Henrique, Aécio Neves, Serra e outros graúdos do partido?; bem como a cúpula do PMDB, como Temer, Jucá, Moreira Franco, Gedel Vieira Lima, dentre tantos outros?”, reclamam senadores do PT.

Muitos têm foro privilegiado e fogem à competência de Moro,  mas não se vê  – por parte da Lava Jato- espetacularizações e estardalhaços sobre esses senhores e  a natural cobertura “ostensiva” da grande imprensa sobre temas de corrupção que não envolvam petistas.

O mais óbvio para a opinião pública era a prisão  de Eduardo Cunha. A demora fez crescer a desconfiança de que realmente a Lava Jato estava interessada somente  em casos em que havia petistas envolvidos. A Lava Jato seria apenas  Lava PT; ou  Lava Lento; ou Abafa Jato.

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Desvendando Moro

Transcrevemos aqui-matéria da revista CartaCapital –  a polêmica causada pelo artigo do físico renomado e professor emérito da Unicamp Rogério Cezar de Cerqueira Leite, publicado na Folha (terça-feira, 11/10) e que irritou Sergio Moro. Cerqueira Leite acusou Moro de comandar um “esquema fanático” e que seu conceito de justiça é, na verdade, “intolerância moralista”.

Para o professor da Unicamp, Moro será esquecido assim que o PT for neutralizado.  “Seus apoiadores do DEM e do PSDB não o tolerarão após a neutralização da ameaça que representa o PT”, diz.

“Desvendando Moro”-Rogério C. de Cerqueira Leite

“O húngaro George Pólya, um matemático sensato, o que é uma raridade, nos sugere ataques alternativos quando um problema parece ser insolúvel. Um deles consiste em buscar exemplos semelhantes paralelos de problemas já resolvidos e usar suas soluções como primeira aproximação. Pois bem, a história tem muitos exemplos de justiceiros messiânicos como o juiz Sergio Moro e seus sequazes da Promotoria Pública.

Dentre os exemplos se destaca o dominicano Girolamo Savonarola, representante tardio do puritanismo medieval. É notável o fato de que Savonarola e Leonardo da Vinci tenham nascido no mesmo ano. Morria a Idade Média estrebuchando e nascia fulgurante o Renascimento. Educado por seu avô, empedernido moralista, o jovem Savonarola agiganta-se contra a corrupção da aristocracia e da igreja. Para ele ter existido era absolutamente necessário o campo fértil da corrupção que permeou o início do Renascimento.

Imaginem só como Moro seria terrivelmente infeliz se não existisse corrupção para ser combatida. Todavia existe uma diferença essencial, apesar das muitas conformidades, entre o fanático dominicano e o juiz do Paraná -não há indícios de parcialidade nos registros históricos da exuberante vida de Savonarola, como aliás aponta o jovem Maquiavel, o mais fecundo pensador do Renascimento italiano. É preciso, portanto, adicionar um outro componente à constituição da personalidade de Moro -o sentimento aristocrático, isto é, a sensação, inconsciente por vezes, de que se é superior ao resto da humanidade e de que lhe é destinado um lugar de dominância sobre os demais, o que poderíamos chamar de “síndrome do escolhido”.

Essa convicção tem como consequência inexorável o postulado de que o plebeu que chega a status sociais elevados é um usurpador. Lula é um usurpador e, portanto, precisa ser caçado. O PT no poder está usurpando o legítimo poder da aristocracia, ou melhor, do PSDB.

A corrupção é quase que apenas um pretexto. Moro não percebe, em seu esquema fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerância moralista. E que por isso mesmo não tem como sobreviver, pois seus apoiadores do DEM e do PSDB não o tolerarão após a neutralização da ameaça que representa o PT.

Savonarola, após ter abalado o poder dos Médici em Florença, é atraído ardilosamente a Roma pelo papa Alexandre 6º, o Borgia, corrupto e libertino, que se beneficiara com o enfraquecimento da ameaçadora Florença. Em Roma, Savonarola foi queimado. Cuidado Moro, o destino dos moralistas fanáticos é a fogueira. Só vai vosmecê sobreviver enquanto Lula e o PT estiverem vivos e atuantes.

Ou seja, enquanto você e seus promotores forem úteis para a elite política brasileira, seja ela legitimamente aristocrática ou não”.

Carta de repúdio à Folha-Sergio Moro

“Lamentável que um respeitado jornal como a Folha conceda espaço para a publicação de artigo como o ‘Desvendando Moro’, e mais ainda surpreendente que o autor do artigo seja membro do Conselho Editorial da publicação.

Sem qualquer base empírica, o autor desfila estereótipos e rancor contra os trabalhos judiciais na assim denominada Operação Lava Jato, realizando equiparações inapropriadas com fanático religioso e chegando a sugerir atos de violência contra o ora magistrado.

A essa altura, salvo por cegueira ideológica, parece claro que o objeto dos processos em curso consiste em crimes de corrupção e não de opinião.

Embora críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja importante manter um ambiente pluralista, a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual, deveriam ser evitadas, ainda mais por jornais com a tradição e a história da Folha.

Sergio Fernando Moro, juiz federal (Curitiba – PR)”

A tréplica de Cerqueira Leite a Sergio Moro

“Operação LAVA JATO – Respondo aqui ao juiz Sérgio, embora ele não tenha se rebaixado a responder a um simples plebeu, preferindo incitar a Folha a censurar meus artigos (Painel do Leitor, 12/10). Acusa-me o juiz de promover atos de violência. O fogo a que me refiro é o fogo da história. Intelectos condicionado por princípios de intolerância não percebem a diferença entre metáforas e ações concretas. O juiz ainda se esquiva de responder à principal acusação que lhe faço, a de que é absolutamente parcial e está a serviço das classes dominantes”.

Frase do dia: “Não foi uma carta, foi uma sentença”. (Elio Gaspari, ironizando, em sua coluna na Folha (16/10), a resposta de Moro a Cerqueira Leite)

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