Doentes
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Li na imprensa que os ministros do Tribunal Superior Federal querem aumento de salário. Dos vinte e tantos mil que recebem atualmente, para R$ 35,9 mil – teto do funcionalismo público – mais benefícios. No embalo, deputados e senadores do Congresso Nacional, que ganham R$ 26,7 mil por mês mais auxílio-moradia, combustível, alimentação, aluguel, passagens, etc., também querem. Provavelmente os estaduais, os vereadores, etc. subirão no mesmo trem. É bom lembrar que parlamentar brasileiro é o 2º mais caro do mundo, menor só que o dos EUA.
É claro que o assalariado deve ter vencimentos corrigidos regularmente, embora um salário por melhor que seja não garanta felicidade no trabalho. Quem gosta do que faz encontra outras compensações. Por isso, pergunto se quem não consegue viver bem com vinte mil reais mensais não estaria precisando de médico em vez de aumento.
Se 26,7 mil mensais são insuficientes, o privilegiado que recebe tal salário deve ser um pródigo ou sofrer algum transtorno, já que somente um perdulário gastaria tanto não tendo que arcar com moradia, comida, transporte, etc. A menos que seja dado à esnobação ou um devasso a torrar o que ganha com extravagâncias, o que também indica desequilíbrio. Vai ver que o sujeito tem mais de uma família para sustentar ou amantes para bancar; goste de carrões e curta lugares badalados.
Para dar aos filhos Camaros, BMWs e Audis para disputar corrida na Marginal Pinheiros a 200 Km/hora durante a madrugada e gastar R$ 180 mil num Jaguar que precisam de aumento? Conforme disse Paulo Oliveira do Comando de Policiamento do trânsito em São Paulo: “Quem é mais difícil lidar? A classe média alta. As operações mais difíceis são onde há maior concentração dessas pessoas. É chocante porque você vê que é um pessoal mais esclarecido. Há uma cultura de que o dinheiro resolve tudo. Que com um carro caro e uma condição social excelente, a lei nunca vai alcançá-los”. (Folha 25. 09.11).
Segundo a Folha de São Paulo 12.01.14 (Painel), “A família Sarney comemorou o Ano-Novo passado com uma grande festa na residência oficial de veraneio do governo. Além de reunir o clã, Roseana Sarney – aquela que queria licitar mais de uma tonelada de camarões, 750 quilos de patinhas de caranguejo e lagosta fresca ao custo de um milhão de reais – convidou empresários e socialites para brindar o Réveillon. Perto da meia-noite, o patriarca José Sarney fez a saudação de Ano-Novo. Segundo jornal da família, o senador “leu trechos da Bíblia e fez prece por dias melhores para o Maranhão, para o Brasil e para toda a Humanidade”. Estaria Deus no meio dessa família de doentes ou no Presídio de Pedrinhas onde filhos seus eram degolados? Segundo Zeca Baleiro “A miséria que assola o Maranhão, o analfabetismo, a cultura antiga dos currais eleitorais são crimes tão hediondos quanto os cometidos em Pedrinhas”, cujas mortes [de presos] deixam legiões de órfãos. “Do lado de fora de presídio maranhense, filhos e viúvas reaprendem a viver após a notícia dos assassinatos”. (Folha 12.01.14).
No Amazonas, por exemplo, foi desbaratada pela polícia uma quadrilha que recrutava jovens pobres e atendia empresários, políticos e gente rica. Programas custavam a partir de R$ 300 e eram feitos em estacionamentos, escritórios, motéis e até barcos. Garotas virgens valiam muito nesse mercado. (Folha 08.12.13). “Tal é o destino do ganancioso: a cobiça acaba com o cobiçoso”. (Pv 1, 19).
Li no JP (06.03.14) que o Brasil tem 65 bilionários. Fortuna deles soma 220 bilhões de dólares. Nomes do setor bancário, construção civil, cervejas, mídia, varejo, grupo Abril, Globo estão na lista. O bispo Macedo, por exemplo, tem US$ 1,1 bilhão. Num país onde quase tudo está por fazer, não é doente uma pessoa que acumula o que nunca vai conseguir gastar?