Em busca de uma voz

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Poderia me

Foto: Reprodução Google

Há filmes que fazem pensar sobre o a dor de ser um artista. Esse é o caso de “Poderia me perdoar”, de Marielle Heller, com a interpretação elogiada e indicada ao Oscar de Melissa McCarthy, no papel de uma escritora de biografias em crise financeira e existencial que passa ganhar a vida falsificando cartas de pessoas famosas.

O episódio, baseado numa história verídica, traz diversos ensinamentos. Lee Israel é a protagonista de um drama bastante comum no meio literário. Escreve, de maneira quase anônima, para dar voz aos outros. Essa característica do biógrafo de estar á sombras do biografado geralmente gera, mais cedo ou mais tarde, algum mal-estar.

O fato é que a crise econômica leva Lee a encontrar na falsificação de cartas de ícones da cultura americana um caminho sem volta, principalmente porque a vaidade e o desejo de ser criativa começam a fazê-la dar a sua voz à voz de outras pessoas, ou seja, coloca no texto dos outros o que ela deseja, não o que elas até poderiam ter dito.

Acompanhada por um amigo magistralmente interpretado por Richard E. Grant, a protagonista nos oferece também ricas possibilidades de refletir sobre o mercado de colecionadores dessas cartas de celebridades. Por que há os que desejam ter consigo esses objetos?

Talvez para terem uma parte daquilo que simplesmente não foram, não são nem nunca serão? Fica mais essa pergunta que o filme levanta sem grandiloquência, mas num tom constante e sereno, como é a vida, uma caminhada em que há sobressaltos, mas em que o cotidiano tem um imenso poder derrisório, no qual cada um busca a sua própria voz.

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