Era uma vez um castelo

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Final de ano é um período em que ficamos nostálgicos, pensando nas pessoas que já partiram e deixaram indeléveis lembranças.

Recordamos antigos natais da infância, os melhores de nossas vidas, porque ainda não conhecíamos o significado da palavra saudade. Vivíamos só o presente, passado não existia e o porvir parecia estar bem distante.

24446124Gosto de pessoas, de animais, mas também tenho fortes ligações afetivas com lugares, cidades, ruas e moradias, que, de alguma forma deixaram marcas em mim.

Guardo muitas recordações da casa de minha avó que se localizava no coração da rua Governador, do meu primeiro apartamento que morei no início de casada, uma quitinete tão pequena que parecia casinha de bonecas. Também tenho muito carinho pela casa onde eu e meu marido criamos os filhos ainda pequenos, sempre cheia de gatos e cachorros que se foram todos, cada um com sua história.

Mas hoje, vou falar de um castelo. Não era meu, não vivi nele, mas o avistava no alto da colina, sempre imponente, o “castelinho” como todos o conheciam. A linda obra do arquiteto João Chadad, tornou-se ponto de referência e acabou dando nome ao bairro que a circundava. O bairro cresceu bastante nos últimos anos, mas o castelo permanecia lá no topo, despertando a curiosidade e a imaginação de quem passava.

Estive dentro dele algumas vezes, pois foi um salão de festas por algum tempo.

Quantas fantasias deve ter provocado em crianças e também em adultos!

Por mais de quarenta anos, reinou soberano. Foi residência do arquiteto que o construiu, foi salão de festas, restaurante e até igreja.

Poderia ter outro destino, transformar-se numa escolinha para crianças. Seria o máximo estudar em um castelo! Como a prefeitura não tinha planos para ele, não o tombou. Foi vendido e decidiram derrubá-lo.

Foi triste vê-lo semi demolido às vésperas do Natal de 2013. A torre principal foi a última a cair, resistindo bravamente às investidas das potentes máquinas. Resistiu o quanto pôde sob os olhares indignados dos moradores do bairro, que viram seu castelo ruir literalmente. Mas cansada de lutar sozinha, sem reino e sem vassalos, a torre tombou e restaram só os escombros.

Parodiando Drummond, havia um castelinho no meio do caminho, que atrapalhava o progresso e precisava sair de cena.

Penso que o nome do bairro deva ser mudado agora. No futuro irão perguntar: por que Castelinho se não existe nenhum castelo? A memória vai diluindo porque as pessoas mais antigas vão morrendo e de certa maneira, a história vai sendo enterrada com elas. Muito pouco restará, e vai virar folclore.

Era uma vez um castelo que emprestou seu nome a um bairro e agora só existe na memória de quem conheceu sua história. Deixou saudade, e fez muita gente sonhar.

 

Ivana Maria França de Negri é escritora

3 comentários

  1. Rubens Morandi Junior em 13/01/2014 às 22:14

    Ao Longe, do bairro alto qdo brincava via este castelo sempre tive curiosidade mas nunca entrei, acredito que era habitado mas demolir foi uma péssima idéia, falta de criatividade e típico do povo brasileiro, não preservamos nossa história nem material nem intelectual.

    • Sergio de Negri em 14/01/2014 às 18:19

      Moro no Castelinho (Ops Jd São Miguel) há mais de 35 anos, e realmente não foi uma boa idéia demolir este que era um patrimônio no bairro, que passou a ser chamado de Castelinho justamente por isso. Agora deveria voltar a ser apenas Jardim São Miguel.

  2. Alan Lima em 15/01/2014 às 19:31

    Achei algo inacreditavel demolir o Castelinho. Quantas vezes na minha infancia olhava ele e ficava imaginando mil coisas. O castellinho deveria ser tombado pelo patrimonio historico. Jamais deveria ser demolido. Eu vivo nos USA a 10 anos e eu vejo aqui o cuidado que eles tem com patrimoniod antigos e que tem representacao para a historia. Um exemplo que deveria ser seguido e que me envergonhou demais nao ter politicos nessa hora para defender esse patrimonio.
    Uma vergonha isso que fizeram com a historia de Piracicaba

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