Homenagem à Néia, Felipe e Carlinhos

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Por tal não esperava. Todos os três mortos!

As situações dramáticas, bem como as melancólicas agonias permeiam nosso viver. As euforias, deleites, períodos de sorte amena também, assim lembra-nos Sêneca. Não me ocorre pensar nos planos caprichosos de um ser supremo… Penso, antes, na época em que conheci Néia ainda começando como depiladora, no corredor lateral à casa o qual nos levava ao quarto dos fundos onde ela trabalhava, em como era o aposento, no muro e nos tantos vasinhos de violetas. “Como estão bonitas, Néia! Essas flores detestam-me”, dizia-lhe eu, entre outras infinitas banalidades femininas.

As mudanças climáticas, então, não eram tão acentuadas, Piracicaba bem menos agitada, Felipe um garoto ousado, irrequieto, travesso; Carlinhos calmo, controlado, trabalhando em excesso e palpando os muito bons resultados de seu labor. Numa época foi assim… Deu-nos, deu-lhes a impressão de permanência, de durabilidade, de que o mundo gira numa órbita lógica, de que tudo tem sempre um sentido facilmente descodificável. Mas este sentido é tal que nos escapa muitas vezes, pois muito maior do que nossas mentes alcançam. A razão do sem razão, a coerência do caos, a dinâmica do acaso, que nunca abole os dados, e por aí vai.

Soubemos da doença do rapaz, da tristeza, do desespero dos pais; seu pequeno e próspero mundo ruía. Ajuda para eles foi pouca, intimidade não tanta. Invadirmos muito não dava. Falamo-nos parcamente, mas sempre torcemos pela recuperação e melhora do moço. Pensávamos neles. Certamente não bastou.

O ser humano enlouquece com facilidade, a sociedade tem valores arbitrários, e cruel é levá-los a sério. O bilhete não adiantará, e Carlos será analisado, julgado sim, odiado por alguns, perdoado ou não por nós, igualmente mortais. Os três incorporados às nossas conversas, colocados na lista dos que já partiram. Mas não me esquecerei do Felipe, dos pais, da alegria com que Carlinhos dizia quando os encontrávamos que, se o casamento era loteria, ele ganhara na mega sena. E víamos Felipe, de cá pra lá, com planos.

Que na complexa dinâmica do cósmico, haja um lugar onde a reverberação do que foi bom e feliz permaneça, brilhe bandeirante, suprema e criadora sobre as atrocidades, injustiças, abandonos, brilhe para sempre e por sobre as incontáveis tragédias das nossas vidas; assim eu desejo.

2 comentários

  1. Antonio Carlos Danelon em 25/10/2013 às 18:20

    Tocante homenagem, Eloah!

  2. Eloah Margoni em 02/11/2013 às 16:06

    Obrigada, amigo! Espero que possa ajudar aconsolar alguém. Eu mesma, quedo-me triste com isso…

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