Lá detrás daquele morro
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Venha para casa, que vem chuva forte. Ou melhor, chumbo grosso. Não posso dizer tudo o que sei. Ninguém acredita. Pegue seu carro, sua mochila, seu terno novo, alguma comida, e traga para cá. Não posso fazer nada a não ser abrigá-lo em minha casa. Venha.
Falando nisso, em Brasília, recentemente, um terremoto varreu para sempre do mapa a nossa Carta Magna. Foi um furacão daqueles, os ventos uivantes do inacreditável subiram a rampa do Palácio.
Quero te dizer que nem tudo está perdido. Apesar do planeta decadente e poluído, há uma réstia de dignidade e de esperança aqui e ali. Onde? Não sei.
Digo-te, meu amor, que os dias passam como se não passassem, que o momento é estático e a penumbra faz sombras nas paredes. Por vezes, teu rosto aparece nelas, límpido e claro. Noutras, é só um detalhe, o recorte da tua boca, teu nariz lindo, o perfil etrusco. No fundo, no fundo, é tua alma que eu busco.
Tenho vocação para ser triste. O médico diagnosticou tipo “um brasão de família”, certa tendência à melancolia contra a qual preciso lutar sempre. Meu pai andava com um lenço no bolso para enxugar o canto dos olhos, chorava ouvindo “Chico Mineiro”. Herdei de meu pai o gesto emotivo e a tristeza da vida.
Em geral, acordo com uma certeza: de que tudo vale a pena neste mundo de Deus. Por alguma razão especial, esta geração foi escolhida para estar aqui, neste século da nossa história. A esta humanidade está reservado um conhecimento que abalará os corações.
Vou morar à beira-mar, ah vou. “Vai nada!”, me aconselha a amiga. “O mar vai subir, é perigoso, agora devemos morar em lugares seguros e altos”. Lembrei-me de uma mulher “sensitiva” que vi na tevê. Contou que morava em Peruíbe, cidade praiana. Teve a visão de um tsunami colossal. Um dia, do nada, apareceu um aviso na tela do seu computador e ela se mudou para Campos do Jordão.
A vida não é um salto alto, eu sei. A vida é luta. A vida contém uma dose exata de beleza, de alegria e de sofrimento, que é para ninguém enjoar dela. Tem também uma dose intrínseca de esperança. Talvez tenha a sua parcela inevitável de horror. Há os dois lados, que é para equilibrar o ato político de viver.
Há momentos em que todos os ruídos cessam e o mapa da noite expõe seu desenho mais denso. No entanto, é essa massa inexata e difusa chamada silêncio que se transforma em impetuosa eloquência, se a alma deseja falar.
Bateu uma saudade funda dele. Destas que fazem o coração ficar pequenininho. Então, era um domingo em que o tricolor ganhou. Eu fui lá, beijei a foto dele e falei, apertando o retrato contra o peito: dois a zero, lindo!
A vida está ficando cada vez mais complicada. Antigamente, se dizia “para o mundo que eu quero descer”. E agora? Qual é o grito de socorro?
Lá detrás daquele morro / tem um pé de manacá
Nós vamo casá / e vamo prá lá / Cê quer? / Cê quer? Ai, meu Deus! Namorar e casar! A noiva fez um vestido e o noivo, decidido, terno branco foi comprar. Namorar e casar. O bolo encomendado, rapadura e melado pra de amor se lambuzar.
Concluindo, reafirmo que a fé remove montanhas.