Luar na cozinha

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Peço licença para uma revelação: viver é um ato de primeira grandeza. Ainda que o mundo venha a ruir completamente, a alma cheia de amor estará a salvo. Viver é um ato de extrema gratidão, quando se ressurge das cinzas após três meses com gripe, uma atrás da outra, e dores supostamente relacionadas à coluna. Rever e abraçar amigos – que bem nos faz!

Quero pensar em idéias inovadoras e discutir o futuro. Que a velharia da mesmice e suas variantes não nos contaminem mais. Abaixo o senso comum, “aquela velha opinião formada sobre tudo”, os preconceitos tolos, as conjecturas ancoradas em premissas pouco consistentes ou sedimentadas em experiências negativas.

Então, em mágico momento, encontro a graça plena na minha cozinha. Vejo a lua refletida no balcão de granito, na extensão da pia. O reflexo atravessa o blindex da janela. A lua se projeta inteira, desenhada no granito. Toco no satélite da Terra e sonho.

A imagem que ali se forma arrepia-me intensamente. Em misterioso êxtase, vejo nossa galáxia, o sistema solar, os planetas orbitando e me recordo das visões que tive na chácara do Campestre, sentada num banco próximo da varanda, vasculhando o céu noturno.

Tomo comigo a lua na pia e vou cuidar de outras coisas. É noite, mas a mulher não para nunca, porque há o que fazer dentro de uma casa. Nós, mulheres, possuímos um dom natural para isso. Ninguém varre o chão melhor que uma mulher. Ninguém organiza louças, talheres, toalhas e demais objetos como ela.

E a cama arrumada? Mãos femininas alisam lençóis e estendem colchas com maestria. Afofam almofadas, perfumam ambientes, fazem a beleza aparecer. Quem pode apresentar uma bela sala de jantar senão a dona da casa?  A mesa abençoada de tantas reuniões familiares. Só ela conhece e nutre profundamente este espaço sagrado.

Uma casa brilha nas mãos de uma mulher. A “rainha do lar” tem sob seu comando cada gaveta, cada quadro na parede, o cheiro bom da comida sendo feita, a roupa no varal, a limpeza e a ordem. Se não for ela a cuidar pessoalmente, é outra mulher, a empregada, laboriosa trabalhadora sem descanso. Como a maioria das mulheres.

Homens há que também se interessam pela arrumação doméstica e já vi grandes talentos. Entendem perfeitamente destas tarefas e as executam bem. Certamente, sentem-se reconfortados se contam com a ajuda feminina.

Andando pelos cômodos, guardando coisas nos seus lugares, volto para a lua redonda que brilha no balcão de granito. Quero subir num raio deste luar e fugir. Para alguma Pasárgada querida, onde também serei amiga do rei. E de lá mandar lembranças para todos. Haverá internet? Aquele abraço. Piracicaba continua linda?

Um abraço apertado aos amigos queridos. Aos leitores deste espaço onde derramo minha alma semanal. Há pessoas incríveis neste mundo e fariam muita falta se aqui não habitassem.

“Fique com Deus!” – escreve sempre um amigo, despedindo-se no e-mail. Fiquem com Deus todos vocês. Sejam abençoados os humildes, bem-aventurados os construtores da paz, consolados sejam os aflitos.

E eu fico por aqui, à espera da noite, para ver o luar na cozinha.

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