Natal dos outros
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É comum a queixa de que cada vez mais o Natal perde seu sentido original. O ‘mundo’ todo comemora a data sem levar muito em conta sua finalidade. Tanto que, passadas as festas, retoma seu velho trote.
Pessoalmente vejo nada de estranho nisso. O “mundo” nunca optou por Jesus e nem por sua Boa-Nova. João no seu Evangelho deixa claro: “Eu não condeno quem ouve as minhas palavras e não obedece a elas, porque eu não vim ao mundo para condenar o mundo, mas para salvá-lo” (12,47). A proposta de Jesus é convite, não intimação. Engana-se quem O segue para ‘salvar’ a própria alma porque salvar-se é caminhar na busca a própria essência, onde está a liberdade plena, que nada tem a ver com poder, posses ou títulos. E nenhum ser humano foi tão humano e livre como Jesus. Só descobre isso quem vive na dimensão do amor. “Quem não me ama não guarda as minhas palavras” (Jo 14,24).
A opção do mundo vem clara já no Gênesis “(…) no dia em que vocês comerem o fruto (…) vocês se tornarão como deuses, conhecedores do bem e do mal” (3,5). Comer o fruto é um ato soberano de quem toma posse de algo. Portanto, quem se porta como deus – que sabe tudo e tudo decide – não precisa de Deus. Tanto que “Ele veio para os seus, mas os seus não o receberam” (Jo 1, 11).
O reino do homem está aí. Seu evangelho se resume em cada macaco no seu galho, em boca fechada não entra mosquito e quem pode mais chora menos. Vale a meritocracia não a fraternidade. Tem coisa boa? Tem e muita, mas não para todos. Por isso tome terrorismo e guerras; disputas, inveja, doenças e câmeras de vigilância; tráfico, miséria, cadeias lotadas, crianças e idosos abandonados, assaltos, favelas, trabalhadores escravos, políticos podres e destruição da natureza.
Ora, o que há de estranho no Natal do “mundo” se acha legal pagar o mico de ver um coroa vestido de Papai-Noel descer de helicóptero; manter comércio aberto dia e noite; cheirar fumaça na Governador; enfeitar árvore e ajudar os outros para entrar no clima; fazer a ceia com muita comilança, barulho e bebedeira para disfarçar a solidão, aliviar a vida depressiva e sem sentido que leva e acordar com o saco cheio disso tudo?
Em vez de nos preocuparmos com o Natal do mundo não seria melhor ver como anda o nosso, já que ‘conhecemos’ seu verdadeiro sentido? Se estamos certos, por que vem Natal vai Natal nossas comunidades continuam na mesma se é nela que Deus age?
Ora, “A vida em comunidade é essencial à vocação cristã. O discipulado e a missão sempre supõem a pertença a uma comunidade. Deus não quis salvar-nos isoladamente, mas formando um povo. Nossas comunidades devem crescer por atração não por proselitismo. A comunidade atrai quando vive em comunhão, pois os discípulos de Jesus serão reconhecidos se se amarem uns aos outros como Ele amou” (DA).
Se alguém ‘do mundo’ adentrar nossas reuniões em busca de acolhida e calor irá encontrar? Se “gregos” nos procurarem dizendo querer conhecer Jesus, temos onde levá-los, se é na comunidade que Ele se manifesta? O que dirão vendo um amontoado de gente olhando pra frente mal dando bola a quem está ao lado, que se estiver precisando de algo ninguém saberá?
Grosso modo falando, a maioria de nossas assembléias não passa de assistidores de missa sem compromisso. Nosso pastor e muitos dos nossos padres se portam como funcionários da Igreja. Entendem de tudo: moral, sexo, homossexualidade, educação de filhos, namoro, direitos sociais, política, etc., mas não expõem a cara por nada. Fizeram-se celibatários a fim de se dedicarem inteiramente ao Reino e ao Povo de Deus, porém parece mais acessível o Papa Francisco que muitos deles.
Depois é o Natal dos outros que está errado!