SAUDADE

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Quando vejo enfeites de Natal, um misto de alegria, tristeza e saudade toma conta de mim. Gosto do tempo do Natal desde a infância. Eu ficava fascinado com as luzes coloridas piscando na laranjeira ao lado de casa. Meu pai montava o presépio bem na véspera porque ele dizia que o Menino Jesus iria nascer naquela noite.

Enquanto iam – meus pais e os mais velhos – à missa na Igreja dos Frades nós, os menores, em casa, lutávamos contra o sono para ver o Menino chegar trazendo os presentes. Tínhamos certeza de sua vinda. Mas quem conseguia? Tão logo esfregávamos a remela dos olhos corríamos para debaixo do presépio. Nem tanto os brinquedos, mas quem os trazia é que nos encantava. Por isso eram sagrados. O passo seguinte era mostrar para os pais, ainda na cama, os presentes que vieram do céu.

Cresci dentro desse clima bem aventurado. Nem eram os brinquedos ou o dia de Natal, mas sua expectativa e preparação que me fascinavam. Começava com a novena. Lembro-me até hoje da oração que meu pai rezava: “Derramai ó céus o vosso orvalho. As nuvens façam chover o Justo; abra-se a terra e germine o Salvador”. Tempo do Advento. Músicas, que no rádio tocavam sem parar; filmes, enfeites das lojas, festões esticados, cheiro de cipreste e pó de serra do presépio que frei Miguel montava atrás da grande cortina, aberta somente na hora do Evangelho ao repicar dos sinos na missa do galo; brilhantina na cabeça, roupa e sapatos novos estreados naquela noite misteriosa.

O sol do dia 25 se punha levando consigo toda aquela magia. Passado o encanto, restava o frágil propósito de melhoria de conduta tomado sob emocionadas juras de amor. Do mais, teríamos que esperar mais de trezentos e sessenta dias para curtir de novo a mesma emoção.

Gostosas e doídas recordações. Recordações que trazem saudade, que significa vontade de outra vez. Porém, nada mais é a mesma coisa: a vida, a família, a gente, as pessoas, a Igreja; e nem os enfeites, aliás, muito feios, talvez por terem virado meio de lucro para “ching-lings” exploradores de seus próprios irmãos, uma vez que nem em Deus acreditam. A Piracicaba de hoje lembra uma cidade pagã.

Não sei se o Natal diz alguma coisa nestes tempos de desencontros. Contudo, carrego a melhor herança que os pais podem deixar para os filhos: a fé. Ela me sustenta nas horas de aflição, faz ir pra frente e ver além das aparências; dá sentido à vida e explica o inexplicável. Portanto, “há um moleque, há um menino dentro do meu coração, toda vez que o adulto fraqueja, ele vem me dar a mão”. (Milton Nascimento). E esse moleque está me dizendo que Deus nos manda de novo seu Filho para dizer que não desistiu de nós e que nos quer muito bem. Nunca como agora precisamos dessa criança porque “Todo ser humano tem dentro de si um vazio do tamanho de Deus”. (Fedor Dostoievski, romancista russo). Não adianta preenchê-lo com matéria, poder e domínio. Os que fazem isso vivem num luxo intenso, mas por dentro carregam uma miséria muito grande. “Quer pouco, terás tudo. Quer nada, serás livre” dizia Fernando Pessoa.

Não poucos acham que seguir Jesus é coisa de piegas, porém a violência virou praga; impérios que pareciam invencíveis e ideologias que se achavam eternas caem por terra diariamente. Mas a palavra dele nunca passa. “É preciso ter a cultura do amor, da preocupação, da confiança, da transparência e da autenticidade”. (Rajendra Sisodia, professor indiano da Universidade de Bentley – EUA, Guru de Abílio Diniz). Não foi isso que Jesus disse há tanto tempo e de um jeito muito melhor?

Para o orgulhoso, se Deus lhe mandar um anjo, vai dizer que é fantasma. Porém, como disse alguém, “mesmo que não deixes Deus entrar, Ele permanecerá em tua porta, pois conhece o teu destino e sabe que irás chamá-lo”.

2 comentários

  1. Marisa Bueloni em 25/11/2012 às 13:44

    Ah, sr. Antonio Carlos!!!… Sim, saudades!… SAUDADES, assim, saudades maiúsculas!
    Saudades do Natal pequenino e belo que um dia existiu em nossos corações!
    Hoje, o Natal celebra a festa de Papai Noel, já notou, não é?
    O Aniversariante foi posto, gentilmente, de lado.
    E la nave va…
    Parabéns pelo texto.sr. Danelon!
    Abraços da MARISA BUELONI

    • Antonio Carlos em 27/11/2012 às 18:52

      Ser lido por Marisa já é uma grande honra, quanto mais um elogio. Obrigado. Muitos pais de hoje enganam os filhos. Papai Noel não tem palavras de vida eterna.

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