SETENTA ANOS

Os textos de diferentes autores publicados nesta seção não traduzem, necessariamente, a opinião do site. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Parabenizo a Diocese pelos 70 anos.  Se vermos a Igreja Católica de Piracicaba como entidade, nota dez. Acolhe todo mundo, está presente na cidade toda e oferece na medida do possível serviço de boa qualidade. Porém, se a vermos como povo de Deus, deixa a desejar. Mostra-se mais ocupada em administrar sacramentos que anunciar o Reino. Respeitando exceções, reunimo-nos para celebrar a Eucaristia, porém nossas assembléias não atraem; faltam-lhes intimidade, comunhão e solidariedade. As homilias nem sempre respondem aos anseios de hoje e pouco acrescentam às aulas de catecismo porque os ministros desconhecem o “coração de sua comunidade”.

Como leigo não me sinto da família. Grande parte de nossas paróquias não tem face comunitária. O clero – grosso modo – se não faz não deixa fazer. Alguns padres transformaram suas paróquias em empresas, pois quanto mais longe do Evangelho mais precisam de dinheiro – ao menos fosse empregado mais na formação de seu povo que em reformas e construções. A relação clero–leigo é hierárquica não horizontal como pediu o Senhor. Na maioria das paróquias não existe projeto para anunciar Jesus.  Os dons que cada um recebeu não encontram espaço para se desenvolver exceto nas pastorais tradicionais tocadas pelo pessoal de sempre. Não opinamos nos destinos da Igreja, embora partícipes no múnus real, sacerdotal e PROFETICO de Cristo. Nosso quinhão em geral não vai além de vender rifas e fazer festas; erguer templos e fazer campanhas para anestesiar mazelas sociais causadas pela omissão do poder público.

Falando da responsabilidade laical o papa Francisco diz que ela “não se manifesta de igual modo em toda parte; em alguns casos, porque [os leigos] não se formaram para assumir responsabilidades importantes, noutros por não encontrar espaço nas suas Igrejas particulares para poderem exprimir-se e agir por causa de um excessivo clericalismo que os mantém à margem das decisões. (E.N 102).

Se Jesus voltasse agora pode ser que questionasse o desinteresse da Diocese pelo diálogo ecumênico; a Eucaristia trancada nos sacrários e servida somente aos ‘santos’. Sendo “pão que ao mundo dá vida”, deveria estar nas ruas, campos, barracos e cortiços; abrigos e cadeias. Em favelas e periferias ela é celebrada quando muito uma vez por mês e nas paróquias centrais há missas em diferentes horas para quem tem têm carro, boa roupa e qualidade de vida. Afinal não veio aos pobres anunciar a Boa Nova?

Não sei se Jesus gostaria de ver sua Igreja aceitando patrocínio de políticos cujos interesses divergem dos do Evangelho; bispo e padres calados ante as injustiças sociais que grassam Piracicaba tornando-a cada vez mais violenta, e a falta de apoio aos leigos que se engajam na política. Que diria a clérigos agenciadores de turismo e benzedores de pontes ornamentais erguidas por administradores refratários à dor dos pobres; às congregações religiosas, que apesar de voto de pobreza, mantém quase vazios dispendiosos e imensos conventos, casas e seminários; aos padres e consagrados que fazem mestrado e doutorado no Exterior enquanto seu povo, por falta de formação e informação, permanece refém duma fé infantil e sente dificuldades em interpretar e trazer para o cotidiano trechos simples das Escrituras?

Não entendam meu desabafo como crítica. Trata-se de um apelo de quem também se sente responsável por isso tudo, mas que gostaria muito de colocar seus dons a serviço do Reino, porém não sozinho. Com pesar faço essas colocações, pois sei por experiência própria e desde minha infância que a Igreja Católica – outras também, mas não como ela – tem as respostas que o mundo tanto busca, mas não consegue apresentá-la porque quem não acredita no mensageiro não acredita também na mensagem. “E uma pessoa que não está convencida, entusiasmada, segura, enamorada, não convence ninguém”. (E.G.266).

2 comentários

  1. LUÍS ANTONIO RÉ em 10/06/2014 às 07:01

    “NÃO HÁ UMA OPINIÃO TÃO ABSURDA QUE NÃO POSSA SER ADMITIDA POR ALGUM HOMEM” – JOHN LOCKE.
    QUERIDO AMIGO TOTÓ VOLTE PARA SUA IGREJA, SUA TRADIÇÃO É GRANDE, TEMOS MUITOS E ENORMES DEFEITOS, MAS OS DONS SÃO MAIORES!
    FORTE ABRAÇO.

  2. Totó em 10/06/2014 às 23:21

    Tradição não muda as coisas, meu amigo. E dons que não melhoram o mundo servem para nada. “E vos, por que violais o mandamento de Deus por causa da vossa tradição?” Mt 15,2. São as perguntas, as dúvidas e os desafios que fizeram e fazem o mundo melhorar, inclusive as religiões. Por que as coisas não podem ser questionadas? Quando todos pensam igual é porque ninguém está pensando, disse alguém. Abraços mais.

Deixe uma resposta