Sofrimento

Os textos de diferentes autores publicados nesta seção não traduzem, necessariamente, a opinião do site. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

imagesPor que existe a dor e como ela entrou no mundo? Não tenho resposta. Como explicar vidas enterradas numa cama anos a fio, dependentes de tudo? Já que a doença é terminal, por que pessoas têm que enfrentar interminável e dolorosa agonia se a morte pode libertá-las num instante – a elas e seus cuidadores? Dá para entender o sofrimento de crianças vitimas de doenças crônicas, feridas pela guerra, fome e abusos? Por que quem sofre vira santo? Como conciliar a idéia de um Deus amoroso e a presença da agrura em sua obra? Sendo Deus, sabe tudo, até o futuro. Sabia, portanto que haveria doenças, crimes, guerras, penúria e perseguições. Por que levou a cabo a Criação? Se com uma só palavra o Senhor pode nos salvar por que a cruz?

Talvez os que provaram do mundo da dor possam dizer algo sobre tal mistério. Pode ser que não consigam mesmo explicar o sofrimento, mas dirão que o mundo da dor é repleto de alegrias e lições. Nosso nada talvez seja a primeira. Projetos, tanto o de se enricar a qualquer preço quanto o de querer salvar o mundo, podem acabar de vez num acidente. Do chão não sairemos sem ajuda; se for grave poderemos ficar por algum tempo dependentes ou a vida toda. Nessa hora, dinheiro ajuda, no entanto, ser amado muito mais já que como disse Sigmund Freud “a pessoa fica forte quando está segura de ser amada”. A adversidade nos faz valorizar o que temos e as amizades que fizemos; rever conceitos e mudar parâmetros.  Na dor a gente entra morto e sai vivo.

Ter metas e objetivos é muito importante, porém não gastar tempo com amizades que brotam pelo caminho é buscar o deserto. Amar e ser amado é o que move o ser humano. Mesmo que píncaros conquiste que farei lá sozinho? Às vezes um bom susto nos ajuda a perceber que o mundo verdadeiro não é sustentado pelo dinheiro, sucesso e poder, mas pela compaixão e pela fraternidade. Essa é outra lição que a adversidade traz. Compadecer-se também significa padecer junto. É uma enorme graça contar, como eu, com um anjo dessa grandeza. Isso implica amor de fato, pois muito mais que sentimento, amar é fazer o que é preciso. No mundo dos negócios isso não existe. Imaginemos nosso mundo sem a compaixão. Será que ainda existiria, mesmo após tanto progresso? Vi no hospital uma legião de pessoas movidas pelo amor, recebi centenas de mensagens cheias de esperança e carinho, e visitas que me ergueram o ânimo. Vi também pessoas enfrentando sozinhas a própria dor; dobrada dor.

Contudo, penso que a grande lição seja a de que precisamos deixar de ligar Deus com sofrimento e cura. Quem inventou a dor fomos nós. A cruz pintou no caminho de Jesus porque nós a pusemos; não lhe demos alternativa. Até pediu ao Pai que a afastasse. Tire o ser humano do mundo e o sofrimento acaba. Desde quando Deus ajudaria uns deixaria outros?  Deus só existe na hora da dor; no sucesso Ele é desnecessário. Ainda não lhe demos chance para mostrar o quanto é companheiro e cuida de nós através das pessoas. Acidentes fazem parte da vida. A maioria deles é fruto de nossa autosuficiência, imprudência e mesquinhez. No entanto, uma fantástica força pulsa em nós. É surpreendente nossa capacidade de superar situações difíceis. Quem colocou isso dentro de nós?

Durante esses milhares de anos habitando o planeta alguém achou defeito na Criação? Sua harmonia e delicadeza só são quebradas pela burrice humana. Mesmo assim, em linguagem mitológica a Bíblia diz que ao perder o paraíso Deus fez túnicas de peles para o homem e sua mulher, e os vestiu. Quer dizer que nunca nos abandona. Deus nos fez livres, e quanto mais donos de nosso destino mais semelhantes a Ele. Isso é fascinante, mas assusta. Muita gente prefere ficar no rascunho. Querem um deus paternalista, que puna maus e proteja bons. Um deus que os tenha como marionetes a fim de não assumirem responsabilidade por si e nem pelo mundo onde vivem.

Conteúdo relacionado

Deixe uma resposta