Teoria de Ano Novo

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2018Às vésperas do Ano Novo, penso na Criação. Fim de ano me remete ao átomo de todas as coisas, às células de cada criatura. Estupefacta, leio que o Universo é imperfeito e tal imperfeição  é a garantia de seu funcionamento, da sua lógica. Engrenagem rítmica que rege essência e aparência, na dialética fatal que pergunta: quem sou, de onde venho e por que estou aqui? O que nos aguarda?

Tudo segue um traçado majestosamente concebido, embora não esteja ao alcance da nossa vã compreensão.  Tento desenvolver uma humilde teoria a respeito do assunto e elaboro algumas teses e leis baseadas na inspiração de um vento que sopra.

O que concluir? Que o Universo possui, sim, uma lógica perfeita. A vida não. O Universo contém a respiração de todo ser vivo, as árvores respiram, como defendia Giordano Bruno. O Universo pulsa em permanente atividade. O sol nasce todos os dias. O Universo tem lógica. A vida não. A vida é o inesperado, o desconhecido, o imprevisível, o que irrompe não se sabe de onde e deseja assumir seu lugar no mundo.

Há no ar o bafo ruim da desesperança. De uma desarmonia que nos inquieta profundamente, uma contradição brutal. Você trabalha feito um louco para pagar as contas e sobreviver e o Kim-Jong-un pode disparar o míssil fatal pelos ares e acabar com tudo. Acabar com este amor que faz você suportar os desassossegos, as dores e a morte. É justo?

O Universo tem um sentido. Ele cumpre a sua função cósmica desde que foi criado. O Sol tem a missão de brilhar todas as manhãs. Haverá tarde, haverá noite, haverá a estética de uma rotina mecânica assombrosa. A vida não tem esta sequência de fatos substanciais contra os quais não há argumentos. O argumento da vida é a hipótese.

O Universo tem sentido; a vida não. O Universo precisa existir para garantir nossa existência. A vida é uma abstração dolorosa do ponto de vista matemático. Na vida, dois e dois não são quatro. No Universo sim.

Veja a poeira que se deposita sobre os móveis todos os dias. Pegamos o aspirador ou um pano para promover a limpeza. Pela janela aberta o pó vai entrando novamente, o Universo produz o pó que vamos limpar amanhã de novo. As árvores produzem folhas e se você gosta da calçada limpa irá até lá varrer. O Universo traz até nós a possibilidade desta humilde reflexão, deste pequenino serviço em prol de nós mesmos.

Estamos inseridos neste contexto que independe da nossa vontade. Não queremos que chova, mas vai chover. O concerto será ao ar livre, mas vem chuva. O Universo não liga se estamos alegres ou tristes, apaixonados ou se rompemos um relacionamento, se estamos doentes ou saudáveis. É na vida que se operam as dores, as lutas, as doenças. É na vida que o Universo derrama toda a sua força e ditatorial soberania.

Rendo-me, curvo-me. À noite, sob as estrelas, desenho uma geografia de sonho para minha vida, uma vez que nada posso contra o Universo, por mais imperfeito ele seja. Tenho na alma a grandeza desta imperfeição, que a tudo rege com mãos invisíveis. A música do tempo soa e reverbera pelas montanhas e vales, no céu e na terra, sonoridade da antepassada beleza. O Universo age. A vida obedece. Assino?

O Universo fará cumprir mais uma volta da Terra em torno do Sol. Estamos todos em órbita. Que o novo ano seja cheio de saúde e de paz!

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