Uma sala de jantar

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images (1)Fico encantada de ver como alguns leitores se lembram de um texto antigo, “Sala de jantar”, de minha autoria. A moça que me atende na padaria diz que não o esquece; a amiga de Minas sempre o relembra e manda bênçãos para a sagrada mesa onde faço minhas refeições (agora, é no balcão de granito, na cozinha). O editor da Revista da Academia me pede permissão para publicá-lo. Uma senhora comenta com uma de minhas filhas que aquele texto a marcou muito. Recebi incontáveis e-mails, cada um contando como era a “sua mesa de jantar”.

Trata-se de uma crônica simples, que celebrava os trinta anos de minha sala de jantar, a mesa onde as filhas fizeram seus trabalhos de escola quando crianças. Sim, sim, com o cuidado de colocar sobre ela um velho cobertor para que nada danificasse o tampo luzidio e bonito.

Aquela mesa abençoada, onde tudo acontece. Ou aconteceu. As ceias de Natal, os almoços e jantares que reuniram a família ao longo de três belas décadas. Alguns já partiram e deixaram sua presença indelével em torno deste móvel indispensável. Os novos foram chegando e ali também vão ocupando seus lugares, para celebrar o que é festa, afeto, amor.

Às vezes, a vida se resume mesmo numa velha e histórica sala de jantar, com seus segredos e intimidades, sua discreta existência. A moça da padaria me perguntou se eu ainda tenho a mesa. Tenho sim, meu anjo. Tenho sim. Logo mais, ela estará completando 37 anos. E continua sendo o coração da casa.

Vejo que algumas coisas simples e singelas tocam profundamente a sensibilidade, a alma das pessoas. O relato de uma mesa de jantar e seus veios impregnados de lembranças, saudades e comemorações, sempre será algo especial e tocante. A minha completará 37 anos e continua sólida como uma rocha.

Penso em como seria se os rumos de nossa existência possuíssem a mesma solidez de uma mesa de jantar e nos apresentassem a segurança que ela nos oferece; a alegria que ela nos proporciona, a bem-aventurança da comida servida com amor, as mãos laboriosas que a cozinharam, o coração amoroso de quem a arrumou.

Arrumar uma mesa de jantar, escolher a toalha mais bonita, os pratos combinando, os talheres muito usados, (ainda os do belo faqueiro, presente de casamento). Os copos, as taças tiradas da cristaleira, os guardanapos; se possível um pequeno arranjo de flores central, baixinho, para que todos possam se ver e conversar. Vinho tinto, senhores, ou a mesa não estará totalmente completa.

Minha sala de jantar completará 37 anos. Anda meio quieta e sem uso, algumas poucas reuniões em torno dela, próprias da mudança da vida, quando os filhos crescem e nos recebem em suas casas.

Hoje, olho para minha mesa de jantar e sei o que ela significa para mim. Para mim e para minhas duas filhas.  Doravante, deverá significar algo para meus netos. Não sei se terei forças para os almoços festivos de outrora, com a imensa pilha de louça para lavar, depois da sobremesa e do cafezinho…

Mas, vamos lá! A vida urge! E o amor não morre jamais!

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