“In Extremis” (138) – Luciano(s) e o sonho de Archimedes

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“Ao construir a pinacoteca, o grande Luciano realizou o sonho imenso do imortal Archimedes Dutra, herdeiro de Miguelzinho.” (foto: reprodução Google)

Se não creio em tantas superstições, admito crer nos inúmeros mistérios da Vida. Pois ela, a Vida, emite sinais. Trata-se do que muitos chamam de “sinais dos tempos”. São simbolismos nem sempre, no entanto, observados ou entendidos. O fato é não haver como escapar à realidade única e inquestionável de sermos partículas do todo. Há quem diga, em imagem poética, que uma só folha, ao cair, faz estremecer uma estrela.

Talvez, uma das mais maléficas das loucuras humanas esteja no dramático culto ao individualismo. É uma cegueira que beira o absurdo. No passado, alguém dizia ser, o homem, o “senhor do Universo”. Aquele para “quem todas as coisas foram feitas”. Tal e desvairada concepção continua levando-nos a equívocos criadores de tragédias sem fim. Pois, na realidade, essa alucinada pretensão parece ser revelação do mais destruidor que há na alma humana: o ressentimento.

O ser humano ressentido é mais perigoso do que o criminoso assumido. Este faz o mal conscientemente, correndo riscos. O ressentido é, antes de mais nada, um farsante. Pois ressentimento é aquele ódio silencioso contra aquilo que não se pode ser ou não se pode ter. Na doentia alma do ressentido, o amargor ecoa incessantemente: “Se eu não posso ter, ninguém terá. Se eu não posso ser, ninguém será.” Até o sorriso do ressentido é sombrio.

Por ser doença, o ressentimento há que ser observado. Isso, no entanto, não significa deva ser tolerado. Há, no mínimo, que se ter cautela. Shakespeare já dizia haver, entre o céu e a terra, mais coisas do que possa entender a nossa vã filosofia. Até o nome que damos a um bebê recém-nascido pode marcar-lhe a vida. Chame-se alguém de Jesus e o nome poderá iluminá-lo ou enlouquecê-lo. Chame-o de Judas e, então, dê-se-lhe suspeição sem fim.

Curiosamente, para mim, vejo o nome Luciano acompanhando-me a vida jornalística. Comecei com o grande, o insubstituível Luciano Guidotti, o mais revolucionário de nossos prefeitos. Com ele, Piracicaba ganhou, por duas vezes, o título de “Cidade Mais Progressista do Brasil”. E, agora, já celebrando as minhas cerimônias de adeus no jornalismo, eis que termino om um outro Luciano, o Almeida. De Luciano a Luciano – meu Deus! – que diferença abissal! O nome que se dá a coisas e a pessoas torna-se como ferro em brasa. Um piano sempre será um piano. Chamar alguém de Antônio remete ao santo que consagrou o nome. Com o nome Luciano, também. Mas nem o Antônio da Silva é o Santo Antônio, nem o Almeida é um Luciano Guidotti.

Que cada qual, pois, apenas siga a sua própria história. Na realidade, porém, o que eu queria dizer, ainda outra vez, é essa nossa atual comédia de absurdos. E de contradições ridículas. Pois esse Luciano de agora quer destruir uma das obras históricas do Luciano de antes, o Guidotti. Ao construir a pinacoteca, o grande Luciano realizou o sonho imenso do imortal Archimedes Dutra, herdeiro de Miguelzinho. E peço que se dê atenção especial a este trecho:

“Em 1956, um ex-orientando de Guido Ranzani, o agrônomo e artista plástico Archimedes Dutra, consegue finalmente lançar em Piracicaba o prédio da Pinacoteca Municipal, sonho de uma geração de artistas da cidade e que se transformaria em referência, com seus salões de belas artes, arte contemporânea, aquarelas e esculturas, entre outras.”

Esse texto é de autoria do atual secretário da Cultura, Adolpho Queiroz, no livro de Guido Ranzani, “Dos solos de Piracicaba às Terras da Amazônia”, página 112, ano 2020. O mesmo senhor é o encarregado, agora, de violentar a Pinacoteca. Sem comentário.

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