Rosas para Rosa de Jesus

rosas

Foto: Banco de Imagens/ B2

Não sei se propositalmente – ou por estar, também, extasiado – o Gordo comanda a barcaça com lentidão. Estamos em silêncio, cada qual tentando captar pedacinhos de todo o encantamento, talvez revivendo antigas lembranças e emoções. Fico à procura do que vi antes e do que ouvi sem nunca ter visto. Penso nos negros pobrezinhos, nos escravos, nas pessoas humildes indo pedir auxílio a Rosa de Jesus, a esperança nos corações. E parece-me vê-los jogando-lhe rosas nas águas do rio após sua morte. Ela se tornou santa na alma de nossa antiga gente.

Rosa de Jesus morava quase à beira do Salto, à margem direita do rio, numa chácara “conhecida por suas belas flores e mais por um romântico lagozinho, todo cercado de flores, resedás e jasmins, em cuja sombra ela gostava de ir à tarde contar histórias dos tempos que não voltam mais”, segundo a antiga e primeira Gazeta de Piracicaba. Nascida em 1791, ela se tornou mítica personalidade piracicabana, levada ao nível do lendário. Sua fama de mulher generosa e santa espalhou-se entre as pessoas mais humildes e,
após sua morte, tornaram-se comuns as manifestações por assim dizer religiosas que se fizeram em sua memória. Em seu necrológio, o jornal diz ter sido, Rosa de Jesus, “excelente alopata, atestado por milhares de curas felizes e por apreciações de muitos médicos nacionais e estrangeiros”. Os pobres, durante muitos anos, passaram a jogar flores nas águas do rio, após a morte de Rosa de Jesus. Com isso, acreditavam que seus pedidos seriam atendidos por ela.

Por que não venerá-la ainda hoje, quando a solidariedade e o amor parecem esclerosados nas almas humanas? Lamentei-me não ter colhido rosas. Tivesse-o feito, pediria ao Gordo parar à beira do Engenho Central e, então, fingir ter encontrado a casa da santinha, atirando-lhe flores de saudade e admiração. O mito e a lenda podem ficar empoeirados, mas nunca morrem.

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