A Pedreira do Bongue é a paixão de Zeuler, o artista

O texto abaixo foi publicado em abril de 1988 no semanário impresso A Província. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

Pedreira

A sensibilidade de um jovem artista plástico piracicabano estuda uma típica paisagem da cidade, a pedreira do Bongue. Assim é a exposição “Ensaio Sobre uma Paisagem”, que fica até o dia 24 de abril (1988) no hall do Teatro Municipal com obras de Zeuler Rocha Melo de Almeida Lima. Para o artista, “a mostra não pretende fazer uma nova caracterização do local, não é bem esse o objetivo, se dissesse seria pretensão minha”.

O que ele pretende é, através das técnicas do desenho e pintura, apresentar novas formas de representação. Embora diga que sua exposição “não é uma coisa de vanguarda, apenas foge dos padrões”, Zeuler teve a preocupação de sair um pouco do lugar comum. Assim, o hall do teatro também apresenta pedras retiradas do próprio local, dando ao público uma réplica da pedreira do Bongue, num efeito preciso de ambientação com o tema.

As 24 obras presentes também foram desenvolvidas através de muita pesquisa. Por exemplo, um conjunto de nove pequenas telas se une, formando um perfil do local. “Com isso — diz Zeuler – não é a tela que acaba delimitando a paisagem, mas sim o contrário, elas tomam a forma do que retratam, alterando o conceito de suporte”. Outros conjuntos, como cubos que representam a própria pedra, procuram transmitir uma sensação tridimensional.

Afirmando que “cada artista tem a sua maneira de se expressar”, Zeuler diz que, para ele, “o trabalho não poderia ser feito de maneira convencional”. Com isso, diz que “se fizesse de forma tradicional, reproduzindo o local em telas, também poderia ter efeito, só que seria mais de configuração”. E acha que seu trabalho pode terrepercussão na cidade, “a maioria pode ficar indiferente, mas creio que ainda existem pessoas com sensibilidade maior, que podem me dar alguma resposta, mesmo que não concordem” .

É que Zeuler Almeida Lima entende que “a discussão sobre as artes acontece ainda de maneira muito restrita”. Mas acha que isso é efeito de um processo maior.  “Talvez seja um problema cultural do país, porque as artes plásticas ainda são consideradas inacessíveis para o grande público. E, se o efeito de nosso trabalho ainda é pequeno, temos que considerar que não é apenas por falta de interesse, mas também de acesso e de informação”.

CENÁRIO

O que ele espera com a nova exposição? “Que as pessoas não passem por ela da mesma maneira como fazem com a pedreira do Bongue, sem nem prestar atenção”. Pois Zeuler acha que, para a cidade, ela não representa quase nada. “E só uma passagem, às vezes nem notam”.

“Para mim, chamava atenção desde criança, porque é um local onde as coisas existem em escala monumental, ela parece um grande cenário, um lugar que não existe”. A escolha da pedreira como tema de sua obra não foi intencional, sem uma razão lógica, a não ser por considerá-la de certa maneira inusitada, por conter cores diferentes, como o roxo, que não estão presentes na maioria das outras paisagens.

Pedreira8 (1)

NOVA PAISAGEM

E quando se fala para Zeuler que sua exposição de certa maneira surpreende, já que a paisagem piracicabana mais retratada pelos artistas é o rio, ele não concorda muito. “Esse trabalho que fiz- esse ensaio temático, poderia ser feito tendo como referencial o rio, porque ele abrange tudo, ele está também ligado ao lado histórico e cultural de Piracicaba”.

Nascido aqui, Zeuler começou nas artes plásticas através do professor Archimedes Dutra. “Tive um excelente relacionamento com ele, me mostrou novos caminhos, apesar de ser acadêmico”. Para ele, isso não é um preconceito contra a arte acadêmica, apenas diz que essa não é sua escolha, já que ela tem a preocupação de ser apenas fiel a realidade. Ele entende que arte não é só isso, tem que ver o mundo, para depois interpretá-lo. “Mas acontece que antes preciso ter uma base e foi Archimedes quem me ajudou” .

Depois disso, teve aulas com Fausto Longo, com o crítico Jacob Klintowitz e com o professor inglês John Swift. E sua atividade de artista plástico funciona paralelamente à profissão de arquiteto. “Ensaio Sobre uma Paisagem”, por exemplo , está ligada com sua tese de mestrado sobre Percepção Ambiental realizado na Faculdade de Arquitetura de São Carlos.

Para Zeuler, muitas pessoas ainda relacionam o fato de um artista também ser arquiteto, com uma falta de emoção n obras. Mas acha que a coisa não é bem assim. “O fato de eu ter uma preocupação com a forma e com a técnica não tira o meu lado emocional na execução dos trabalhos. Porque a arte não é apenas uma coisa ou outra, é a união do nosso sentimento com a habilidade e o talento de fazer o que se pretende”.

Apesar disso, acha que se falar em inspiração “é uma coisa ainda um pouco romântica”. Pelo menos ele não dá essa definição para explicar porque pinta. “As minhas obras são mais fruto de uma intuição em cima de um conhecimento, inclusive, elas não são coisas acabadas. Inspiração pra mim seria na verdade ter o prazer da intuição e saber como torná-la visível”.

1 comentário

  1. Roosevelt Fernandes em 04/06/2018 às 07:51

    Nosso grupo (NEPAS) se dedica há mais de 10 anos no estudo da percepção ambiental e social em segmentos formadores de opinião.
    Nossas pesquisas (no Brasil e exterior) podem ser acessadas em http://www.nepas.com.br e temos interesse em desenvolver pesquisas em conjunto com outrosgrupos.

    Roosevelt
    Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental e Social / NEPAS
    [email protected]

Deixe uma resposta