E todos os rituais falam de Deus

O texto abaixo foi publicado em setembro de 1987 no semanário impresso A Província. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

Não há qualquer dúvida de que as pessoas estão mesmo à procura de Deus, nem todos contentando-se mais, no entanto, com o formalismo de religiões sempre tidas como as “verdadeiras”. Novos ritos e novas seitas, búzios e espiritualismos orientais vão se tornando parte do cotidiano de muitas pessoas que, num número crescente — conforme a realidade está mostrando para quem tem olhos de ver e pelo testemunho das próprias pessoas — vão vivendo verdadeiros sincretismos religiosos, misturando conceitos e preceitos, rituais e liturgias diferentes.

Parece não mais haver a quase unanimidade em torno da Igreja Católica, nem mesmo em relação às religiões cristãs oficialmente reconhecidas como tais.

A popularização da fé é um processo visível. E o conceito filosoficamente verdadeiro de que  “Deus está em todos os lugares” mostra indícios de que a fé pode caminhar para algo descompromissado ou, então, engajado de uma forma diferente.

A Província acredita que esta é uma questão que merece ser mais e melhor analisada, assunto para teólogos, sociólogos, psicólogos – pois pode estar em jogo a saúde psicológica das pessoas. Pois a verdade é que não são apenas pessoas humildes e pobres que começam a viver esse sincretismo religioso. O processo começa a atingir todas as classes sociais, como se o nível de informação não mais significasse tanto. O debate seria salutar.

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Misael Bozon Penteado é pastor da Igreja Evangelho Quadrangular. Está no pastorado há 24 anos, mas somente há um ano e meio em Piracicaba. A primeira explicação que deu foi em relação ao nome de sua igreja, que segundo ele significa os quatro pontos cardeais de sua doutrina: Jesus salvador, Jesus batizador com o Espírito Santo, Jesus médico divino e Jesus, o Rei que voltará.

Quando a equipe de reportagem chegou à igreja alguém cantava; não sabíamos quem era, mas parecia feliz. Depois o pastor explicou que eles costumam cantar muito; usam guitarras e batem palmas durante o culto: “Deus está onde está a alegria”. É a maneira deles louvarem a Deus e “Deus habita no meio dos louvores”. Mesmo quando morre um dos membros, eles cantam louvores a Deus, pois acreditam que a morte é o encontro definitivo com o Salvador.

Milagre, segundo o pastor, são as bênçãos extraordinárias de Deus; e a salvação da alma, o perdão dos pecados do homem, são os grandes milagres de Deus. Ele conta que muitos milagres têm acontecido em sua Igreja, principalmente cura de pessoas doentes e completa dizendo que pessoas das mais variadas religiões (católicos, espíritas, etc) procuram sua igreja para isso.

Fé ele define como o “firme fundamento das coisas que não se vê e das coisas que se espera”, enfim, confiar em Deus, e acredita que a atual diversidade de religiões deve-se ao fato do povo estar desejoso de Deus. De acordo com o pastor, sua igreja tem conseguido muitos novos membros, pois lá encontram a pregação pura do Evangelho.

A igreja tem dois sacramentos entre seus rituais: o batismo nas águas (por imersão) e a Celebração da Santa Ceia, uma vez por mês. Em relação à não existência de imagens Na igreja, ele diz: “a igreja não tem imagens, mas tem muitos santos”, pois todos aqueles que seguem o Evangelho são santos.

A cura para todos os males: JOHREI

A Igreja Messiânica tem sua Casa de reunião em Piracicaba dirigida pela ministra Arlete  Amorim Braga, e está ligada à Casa de Difusão de Rio Claro, dirigida pelo ministro Pedro Partezan.

A religião é de origem oriental, foi fundada por Mokiti Okada “Meishu-Sama”. Tem como atividade básica o Johrei, mas a Arte e a Agricultura Natural são consideradas “colunas” para a salvação da humanidade.

Pessoas de todas as religiões e idades procuram a Igreja Messiânica em busca de alívio de vários males, entre eles a cura de doenças. Porém, são considerados membros somente aqueles que, depois de completarem um curso de Iniciação (sete aulas), passam a ministrar o Johrei.

O Johrei, segundo a ministra, é a transmissão da luz divina para purificação do espírito e tem como finalidade dar felicidade para as pessoas, tirando-as do sofrimento, do conflito, da doença e da miséria, que são os grandes males que assolam a humanidade.

Católico, espírita e jogador de búzios

Silvio Angeleli Júnior é católico, vai à frequência à missa; é umbandista há 15 anos, tendo sido iniciado pela madrinha Isis Cordeiro, mãe Moreninha. Além disso, joga búzios há seis anos.

Estranho? Segundo Júnior nada há para estranhar e explica que os escravos vindos da África foram obrigados a mudar as imagens dos orixás por imagens dos santos católicos (religião oficial do país). Isso é o que se chama de sincretismo religioso, ou seja, a cada orixá, corresponde um santo católico, sem diferenças. Além disso, “Deus está em todos os lugares”.

Quanto à Igreja Católica, ele a considera linda, mas diz que há muita hierarquia, muitas normas e isso dificulta a aproximação dos fiéis com o padre por exemplo. “É difícil um alcoólatra ou um casal com problemas ter acesso a um padre para conversar e receber conselhos. É por isso que as pessoas o procuram, pois além de jogar búzios, ele conversa e procura aconselhar.

Mas há também os curiosos e os políticos que o procuram principalmente em época de eleições. Até psicólogos, quando já não conseguem resolver os problemas de seus pacientes, mandam-nos para ele.

Júnior mostra-se feliz em poder ajudar as pessoas, porém diz que “é lembrado na aflição, mas esquecido na gratidão”.

A reportagem d’A PROVÍNCIA, em sua caminhada por templos e igrejas, entre seitas e religiões, tem de reconhecer e admitir que há uma busca comum às pessoas: o desejo de ser feliz, de livrar-se de seus males físicos, a busca de uma resposta mágica para problemas que lhes parecem sem solução. E essa resposta acaba sendo como que um conforto quando as pessoas encontram mais atenção, mais proximidade com os seus pastores, no ministério de rituais e liturgias. A necessidade de um encontro com Deus é algo comum a todos. E quanto maior a intimidade com aquele que ministra os sinais – intimidade no sentido de uma compreensão emocional e espiritual – mais a resposta parece estar próxima delas.

O que pensar disso? Não é a nossa função, mas a de educadores, religiosos, sociólogos, psicólogos, que pretendemos ouvir em que uma próxima edição.

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