Agonia

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agoniaSe fossem competentes e preparados para ler os sinais dos tempos, nossos políticos teriam aberto as portas às manifestações populares logo de início. Teríamos hoje uma situação muito diferente, pra melhor, claro. Perceberiam que o povo brasileiro está amadurecendo e quer participar, tomar nas mãos os destinos da nação. No entanto, salvo raras exceções, deram um show de imaturidade e incompetência, demonstrando que a ausência do verdadeiro dono, o povo, facultou-lhes a posse da coisa pública em benefício próprio. Trataram os insurgentes como bandidos, tanto que para recebê-los puseram a polícia, cuja truculência abriu as portas a todo tipo de violência, culminando no inédito fato da suspensão do desfile do último dia 7 de setembro.

O prefeito, por exemplo, se portou como monarca. Do alto de seu castelo de vidro classificou os manifestantes como baderneiros, já que os súditos fiéis que a corte sustentam estavam trabalhando ordeiramente ou, como boas ovelhas, satisfeitas com o capim que as mantém gordinhas e saudáveis, mesmo sob condições hostis.

Na Câmara de Vereadores a coisa foi pior.  Foram chamados de drogados, violentos e desocupados. O parlamento virou trincheira; barricadas foram erguidas e a Casa de Leis parece hoje um forte apache. Como era de se esperar, o coronel comandante agiu com truculência. Seus oficiais subalternos cerraram fileiras, afinal o sistema elitista e excludente – que tanto os beneficia – implantado nesta cidade por empresários e políticos inconsequentes está em xeque. O radicalismo então latente se consolidou.

Coerentes com a conduta que há anos os caracteriza não querem conversa.  Querem caçar os ‘baderneiros’ que lhes tiram o sossego e mandar para a fogueira aqueles que ousam questionar ou criticar sua conduta. Segundo a imprensa local, já são 35 os processos individuais – custeados a maioria com recursos públicos já que ‘raposa perde o pelo, mas não perde o vício’ – contra cidadãos que publicamente os desabonaram, expondo assim um quadro perverso que mostra um povo aviltado pelo Executivo, enganado pelo Legislativo e ameaçado pelo Judiciário.

Nossa câmara parece uma confraria. Mesmo os da ‘oposição’ não passam de surfistas de ondas favoráveis. Suas intenções são personalistas. O único vereador ‘diferente’ – como eles mesmos dizem – virou bode expiatório. É tido como articulador

e responsável por todos os ataques, mesmo os mais exaltados que a Câmara tem sofrido. Sua atitude assumida antes de eleito de devolver parte do salário – imoralmente elevado pela legislatura anterior – o torna vitima de perseguições e seu jeito simples o expõe à chacotas.  É constrangedor. São 22 contra um; nem os colegas que comungam na mesma Igreja – a Católica – o defendem. Do que propõe quase nada é aprovado. Seu chefe de gabinete – homem de histórico inquestionável na cidade – foi arbitrariamente exonerado, e seu grupo de apoio formado por cidadãos interessados unicamente em implantar a participação popular através de um mandato coletivo é visto com reservas.

Do lado direito do plenário da Câmara está pendurado um crucifixo dos mais belos que conheço. Porém, vendo de longe, parece que o Cristo está em eterna agonia. Certamente não se sente bem naquele lugar, já que vê corações e sabe da intenção de cada um. Contudo, ali se juntam vaidade, rancor, oportunismo, interesse próprio, subserviência, interesses corporativos e aferramento doentio ao poder. Difícil o bem ali prosperar.

“(…) nossa política não está preparada para movimentos sociais de reivindicação”. Celso Luis Gandolfi, professor de história – FATEP. (JP 07.09.13).

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