Ataque do demo

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demo

Foto: Reprodução Google

Sofri um ataque do demo. Deste mesmo que você está pensando. Do capeta. Vade retro! Três dias e três noites sem dormir e sem comer. Bem que ouvi um rumor de patas a minha volta, mas julguei fosse o tropel dos cavalos do Apocalipse. Não era. Era o tinhoso em pessoa me atacando pelos flancos. De frente, ele não tem coragem. Covarde das trevas.

Por um breve descuido do meu Anjo, ele atacou. Pérfido, ardiloso, sorrateiro. E fez um estrago geral. Aparece agora, e espeto tua bunda com a ponta da minha espada afiada no zelo apostólico! Vem, que te expulso com um cabo de vassoura e com meu terço bento vindo do santuário de Fátima.

Bastou invocar o nome de São João da Cruz num texto, para o cão raivoso uivar das profundezas abissais, lá da sua quentura eterna. Disse, me desafiando: “Não vai publicar, não vai.” Respondi: “Pois vamos ver”. Ah, seu devorador de almas! Ainda há Quem vença esta batalha. Existe Alguém acima de ti.

Valei-me Nossa Senhora das Graças! São Miguel Arcanjo, príncipe da milícia celeste, defendei-me! Meu santo padre Pio de Pietrelcina! Santa Brígida da Suécia, minha protetora e padroeira das viúvas!

Sim, a fera me atacou. Aquele que ruge à nossa volta como um leão. Foi esta criatura tenebrosa que espreita nossas portas, camas e mesas, passa por todos os vãos, sobe no telhado, espia lá de cima, conhece o que fazemos e o que amamos. Por Deus, como não adivinhei de imediato? Caí que nem pata em suas artimanhas.

Ah, que eu tenho bem guardado meu vidrinho de água benta, o sal exorcizado, a vela de sete dias, o escapulário marrom, o óleo de São Rafael e a água da fonte de Lourdes. No pescoço, o amado crucifixo que só tiro para fazer exames de imagem. Mas vem cá, seu miserável duma figa! Vem, que eu sou uma mulher destemida. É isto que te incomoda? Que um considerável contingente de mulheres virtuosas e cultas se esforce para imitar as virgens sábias da parábola, e mantenham bem providas de azeite as suas lâmpadas?

Ora, que te arrebento as fuças, seu traste imprestável. Estou pronta para te enfrentar com minhas santas armas. Há um exército de anjos acampando em torno da minha casa e não perdes por esperar. Corre daqui, seu sacripanta! Ou faço espumar o teu rabo. Some, ou meto uma bala de prata na tua testa. Vou ficar de tocaia, montar campana e, ao menor sinal de teu rastilho, empunho meu pequenino crucifixo do Senhor no Calvário, bento por frei Haroldo.

Lutei, lutei. Santa Tereza d´Avila lutava com o demônio e o santo padre Pio também se esgotava. Consta que a cela do padre amanhecia toda revirada, a cama fora de lugar, os objetos atirados no chão. De noite, no convento, os frades ouviam o barulho de cadeira voando, arremessada contra a parede. “Escuta lá, é Pio lutando”.

Ah, combate de glória! Conheci uma mísera parte da árdua peleja, eu que nem santa sou. Sim, o lençol revirado, a noite duríssima. Mas o que é isso, afinal? É minha alma em luta, meu espírito intrépido no combate. Minha Bíblia sempre aberta nos Salmos, sobre a cômoda. Meu terço embaixo do travesseiro. Minha lâmpada cheia de azeite. Meu equilíbrio precário buscando sustentação, mas para cair é um sopro. E o tinhoso soprou, soprou…

Só que minha corda não era tão bamba assim. E maior minha fé, meu amor pelas coisas que amo. Imensurável a minha estima pelas pessoas. Consegui resistir, seu velhaco traiçoeiro. Aparece, que te espanto com a Oração do Exorcismo. Uma ladainha como a dos mineiros, uma reza bem forte. Que mostrem para nós onde mora o cálix bento e a hóstia consagrada.

Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

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