Quem semeia vento…
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As entidades de Piracicaba estão preocupadas com projeto de lei tramitando na Câmara, que atribui aos vereadores poder para suspender registro de utilidade pública daquelas cujos membros praticarem “calúnia, injuria e difamações” ao Executivo, Legislativo e Judiciário. Será que as consequências das atitudes de membros de uma organização podem recair sobre ela? Posso estar enganado, mas para quem vem acompanhando o movimento do Legislativo nestes últimos anos, tal proposta cheira retaliação; e vem se somar a uma série de medidas que envergonham uma cidade que já foi exemplo de ousadia democrática. Sugiro às entidades que deixem de dar visibilidade a uma proposta descabida como esta, afinal a maioria delas goza na cidade de muito mais prestígio que essa Câmara de Vereadores.
Não se rebaixem. Não são vocês que precisam do Estado. Ao contrário, ele precisa de vocês. É dever do poder publico fazer o que vocês voluntariamente e com grandes dificuldades fazem, especialmente ante uma carga tributária como a nossa, que oprime os mais pobres, dos quais o Governo tira com uma mão o que dá com outra.
Fui assistente social de um abrigo e sei como é difícil. Quem nunca ajudou não tem direito de cobrar; aliás, durante meus 15 anos de trabalho naquela instituição nunca fomos sequer visitados por políticos exceto durante campanhas. Sei que existem mal intencionados, como em qualquer organização; para puni-los existem leis suficientes; basta que sejam levadas a cabo por autoridades que honrem o cargo.
Sugiro às entidades deixarem o projeto 9/14 transcorrer livremente, assim conheceremos como pensa cada parlamentar. Caso aprovado, as entidades poderiam romper seus convênios com a prefeitura, que teria, então por força de lei que arcar com a legião de sofredores – produtos desse sistema socioeconômico injusto, fabricado e sustentado justamente por políticos – que as entidades magistralmente assistem. A cidade entraria em pânico. O boicote à Festas das Nações, por exemplo, também poderia causar um impacto importante.
Senão o Legislativo que cuide das crianças abrigadas no Lar Franciscano, na Casa do Bom Menino e tantas instituições que acolhem quem a sociedade despreza. Poderia também servir-se do monte de assessores e funcionários de confiança pendurados na Câmara para cuidarem dos portadores de necessidades especiais, dos doentes, migrantes, dependentes químicos, idosos, etc. O vereador autor de tão rancorosa proposta poderia sair na frente e assumir os mais de duzentos jovens em liberdade assistida feita de forma impecável pela PASCA através do SEAME.
Senhores vereadores, vocês têm assessores, advogados, recursos e ganham salário que os coloca entre os ricos da cidade para fazer leis que visem o bom andamento da coletividade e tragam justiça aos mais sofridos, não as que visem seus interesses. Estão aí para dar voz ao povo e promover o debate da coisa pública. Vocês não estão aí para aprovar o que manda o Executivo como faz a maioria de vocês. Aliás, muitas contas da gestão passada foram recusadas pelo TCE; se vocês tivessem fiscalizado não estaríamos livres de mais este vexame?
O que se planta se colhe. É o que vem acontecendo com esta Casa. Se não perceberam ainda devo concluir que são cegos ou não são bem intencionados. Vocês estão conseguindo comprometer o pilar de sustentação da democracia, o Parlamento. Se não querem ser criticados caiam fora ou ouçam a voz do povo, não da massa, mas dos cidadãos que lutam por uma cidade mais justa. Se não aguentam o tranco quais interesses mantêm muitos de vocês aferrados ao cargo há 20, 30 anos?
“Quando as pessoas são puras, as leis são desnecessárias; quando são corruptas, as leis são inúteis”. (Benjamin Disraeli).