Solidão

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deus-costuma-usar-a-solidc3a3o-para-nos-ensinar-sobre-a-convivc3aancia-c3a0s-vezes-usa-a-raiva-para-que-possamos-compreender-o-infinito-valor-da-paz-paulo-coelho1Segundo Miriam Subirana (“Atreva-se a Viver” – Vozes), estamos sozinhos, conosco mesmos, com nosso passado e presente. “Fugimos do silêncio porque fugimos da solidão. Na solidão a gente pode se ver realmente, dar-se conta e se transformar”.

Somos parte de um todo. Nossa solidão acabará quando a ele nos reintegrarmos. Para Fiódor Dostoievski, romancista e artista russo (1821-1881): “Todo ser humano tem dentro de si um vazio do tamanho de Deus”. Portanto, é impossível preenchê-lo com humanos. Nossa autosuficiência reluta aceitarmos isso; então não temos paz.

Mesmo querendo, não conseguimos fazer o outro – por mais amado que seja – sentir as coisas como nós. O inverso também é verdadeiro. Pessoas se dizem incompreendidas, como se fosse possível alguém penetrar seu interior. É exclusiva essa tarefa. O máximo a esperar do outro é que nos ajude a entender a nós mesmos. “Decifra-me ou te devoro”, dizia a esfinge. Passar a vida sem se conhecer é o maior dos desastres. Aliás, o único. Uma boa companhia com uma boa dose de amor ajuda muito, não importa o sexo ou o grau de compromisso. Mas, o amor é preciso construí-lo. Nesse processo, vamos desmontando o que fizeram ou permitimos que fizessem de nós para retomar nossa originalidade. “Ninguém transforma ninguém e ninguém se transforma sozinho. Nós nos transformamos no encontro”. (Roberto Crema, psicólogo).

Carnaval vara a quarta-feira e a turma quer mais. Pessoas relutam voltar para casa apesar de cansadas e ouvidos zunindo. Fim de festa é sempre deprimente. No entanto, não é a festa, o show, o carnaval, o culto, o jogo que prende, mas a companhia porque ameniza solidão de quem corre de si. Não perceberam ainda que precisamos do outro para retomar nossa identidade, celebrar a vida e não para carregar nossa falência.  O pânico da solidão levou muitos a tirarem a vida de quem se cansou de tentar amá-los.

Às vezes sufocamos familiares e amigos como se possível fosse manter-se rodeado deles a vida toda. Família é uma estrela que vai se desintegrado; cada um toma seu rumo. Precioso é o tempo que se passa juntos; curto demais para perder com desavenças. Segundo Paulo Leminski, escritor brasileiro (1944–1989), “as pessoas existem para dar calor umas às outras”. Portanto, companheiras de viagem e estão para servirem umas as outras, embora poucos descubram a alegria que vem do servir. Aferrar-se a elas e impedi-las de serem o que vieram ser é coisa de doente.

Vendo de longe, a vida por si só não tem sentido. Seguindo um curso normal, metade dela passarmos agregando e outra perdendo. Muitos só perdem, e os que só ganham não levam. As despedidas e perdas como doem! Até os mais aguardados momentos passam. Todos se vão e sozinhos ficamos para juntar os cacos. Estamos para conviver e não para sobreviver. A necessidade desmedida de estar sempre rodeado de gente pode indicar fuga dos apelos internos cobrando um sentido para vida.

Não sei se o Deus que Fiódor fala é o mesmo das igrejas. Gostaria de ser mais íntimo DELE. Pelo pouco que O deixei de mim se aproximar senti um grande amigo. Ouve-me como se eu fosse exclusivo; os que o procuram sentem o mesmo. Uma só réstia de seu amor me faz sentir irmão de todos e de toda a criação. Fui livre para acertar e errar sem deixar de sentir seu cheiro a minha volta. Nunca facilitou minha vida e até agora não tive descanso porque Ele não dá sossego. Quer que eu ajude a melhorar o mundo a começar de mim. Tem serviço pra caramba, porém é assim que a vida se faz dom, alegria e ganha sentido. Quando vejo o mundo virado no avesso sinto medo, mas sei que a cartada final é Dele, inclusive a de que nos reencontraremos todos um dia, e a festa será eterna. Por tudo isso e muito mais, ouso parafrasear o grande Beethoven, compositor alemão (1770-1827): “Só vos podeis inspirar-me. Vós, meu Deus, minha salvação, meu rochedo, meu tudo; em Vós somente porei minha confiança”.

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