“In Extremis” (63) – Um prefeito de couves e carvalhos

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(imagem de Pexels, por Pixabay)

Sei lá em que lugarzinho estarei do infinito quando se iniciar a nova era do mundo. Com olhos humanos, sei que nada verei. No entanto, sinto que, em espírito, participarei da próxima aventura de viver. Nem que seja, apenas, como espectador. E, se possível me for, continuarei, como todo razoável jornalista, a meter o bedelho nas coisas feitas.

É esperado: essa hecatombe irá passar. Passará como passam, também, tufões, furacões, vendavais, a fúria de vulcões. Passam e deixam consequências, muitas delas irreparáveis. Por isso, não vejo, nestes tempos, espaço para otimismo. Perplexidade, expectativa e até esperança, sim. Mas ser, agora, otimista, soará como um irrealismo infantil ou apenas idiota. Pois estamos próximos do grande, do imenso e novo desafio: enfrentar o desconhecido, prever o imponderável, construir sobre escombros. E, em especial, escombros morais. Que, inevitavelmente, conduzirão a mudanças e transformações legais.

O horror passará. Mas o vírus vingador irá permanecer entre nós. E o grande desafio, sinto-o, será o de, primeiramente, vencer a perplexidade coletiva que parece levar-nos a uma espécie de inércia mental. Pode, até mesmo, ser um medo silencioso na expectativa do desconhecido. E essa inércia – ainda que natural e justificável – poderá trazer-nos problemas ainda maiores, mais difíceis de resolver. Na verdade, trata-se da eterna angústia diante da encruzilhada, onde se abrem caminhos para decidirmos para onde ir. Para a frente, voltar? O caminho da esquerda, o da direita? Ficar parado é imobilizar-se.

A responsabilidade, creio eu, torna-se ainda mais grave diante das eleições municipais que nos estão à porta. Piracicaba, nestes 250 anos, sempre deu testemunho de um pioneirismo cauteloso, não aceitando, de imediato, o novo repentino, para não confundi-lo com simples novidade. Quando, porém, os novos horizontes se nos apresentam como verdadeiros, os piracicabanos nunca tememos reconhecê-los. Ora, que escolhas farão os partidos políticos, os eleitores? Será que – agora, estúpida e insensivelmente – seguiremos referenciais e modelos anteriores, superados, malfadados?

O novo prefeito terá a missão e a responsabilidade de entender os novos tempos, de estar à altura deles. O novo Legislativo não poderá mais ater-se a mezinhas supérfluas. Um dos eternos ensinamentos de Ruy Barbosa, no longínquo 1910, parece-nos indicar o caminho: “Uns plantam a semente da couve para o prato de amanhã; outros, a semente do carvalho para o abrigo ao futuro. Aqueles cavam para si mesmos. Estes lavram para o seu país.”

Tenho, para mim, que um novo prefeito precisará, ao mesmo tempo, plantar as sementes da couve e do carvalho. Milhares de famílias estarão em dificuldades penosas, muitas delas passando fome. Milhares de jovens não enxergarão luz na escuridão. A coragem de ser honesto e lúcido obrigará os próximos dirigentes a uma união sólida, independentemente de partidos, que estes já perderam a importância. Por que não se estabelecer um pacto, antes das eleições, para a escolha de dirigentes que sejam indicados não por sua popularidade, mas por, pelo menos, um potencial de transformação?

Não há mais, creio eu, que se votar em um simples candidato. Os partidos precisam apresentar líderes, sim, mas que estejam acompanhados de conselheiros administrativos especializados. Que, com os candidatos, surjam conselheiros sociólogos, filósofos, antropólogos, ao lado da máquina administrativa. Sem estudar o que virá, não haverá como governar. Se não plantar couve, não haverá quem se abrigue sob o carvalho.

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