Palacete Boyes: “a beleza e a perfeição das coisas antigas” (3 – final)

Este texto foi originalmente publicado no jornal “A Província”, na edição de 8 a 31 de agosto de 1992.

De Luiz de Queiroz, à Família Boyes

palacete Boyes foto principal

Embora a Cia. Boyes tenha tido um papel fundamental e de destaque na história do desenvolvimento econômico de Piracicaba, muito pouco se escreveu e se pesquisou sobre ela. Os documentos e publicações são raros e não tendo seus proprietários, nas últimas décadas, se fixado e mantido relações mais próximas à cidade, a indústria praticamente se manteve à margem dos comentários e da curiosidade local. A não ser por uma greve em que ganhou as primeiras páginas dos jornais, muito pouco se disse e se analisou sobre a própria trajetória da Boyes.

Recente monografia apresentada como trabalho para conclusão do curso de Ciências Econômicas na UNIMEP, de autoria de Patrícia Hunther Haack, recupera, entretanto, um pouco desta história, apresentando inclusive detalhes significativos.

Retomando desde o surgimento do empreendimento, nascido em 1876 pelas mãos de Luiz Vicente de Souza Queiroz, com o nome de “Fábrica Santa Francisca”, Patrícia chega até os dias atuais, analisando especialmente a origem do capital que deu origem e garantiu a sobrevivência e o crescimento da fábrica. Segundo suas  pesquisas, o também idealizador da ESALQ, já aos 24 anos de idade, herdou a Fazenda Engenho D’Água com a morte do pai, o Barão de Limeira. Ali, às margens do rio, ele criaria a nova fábrica de fiado todo o maquinário necessário da Inglaterra. De família ligada à agricultura do café, ele incentivaria, entretanto, o cultivo do algodão para abastecer os teares. E em 1876, quando iniciou sua produção, a “Fábrica Santa Francisca”, com 450 operários, representava 20% a 25% do setor têxtil do Estado. A pesquisa indica, entretanto, que, já em 1892, com outros interesses, Luiz de Queiroz torna-se sócio da “Companhia de Cultura de Tecidos de Algodão S/A” no Rio de Janeiro, transferindo a fábrica como contingente para o fundo social desta companhia. Sem que o novo grupo se interessasse efetivamente em explorar o potencial da fábrica, ela permaneceu fechada por quase dois anos ao final do século, tendo sido reaberta em outubro de 1898, vendida a um sindicato carioca do qual fazia parte Manuel Buarque de Macedo, que viria a ser seu futuro proprietário.

Do Rio de Janeiro, o engenheiro transferiu-se para Piracicaba e assumiu diretamente a gerência da fábrica, numa transação em que à semelhança de uma hipoteca, colocava a própria empresa como garantia ao pagamento da dívida assumida junto ao Banco da República do Brasil. Mas a luta que caracterizou Buarque de Macedo nesta região deu-se com relação à criação de uma estrada de ferro que servisse Piracicaba. Sua pretensão era de construção de uma ferrovia que ligasse o município a Limeira, o que facilitaria inclusive o escoamento da produção, já que, para ser distribuída, ela necessitava inicialmente ir até São Paulo para depois retornar a outras regiões do Estado. Caso se concretizasse sua intenção, a ligação seria feita diretamente com a Paulista e a Mogiana, já em pleno funcionamento.

Desanimado com sua luta infrutífera – a cidade só resolveria o problema com a chegada da própria Paulista em 1922 – Macedo viu o Banco da República do Brasil acabar por vender a fábrica a Rodolpho Nogueira da Rocha Miranda, em 1902. Sua denominação passou, então, a Arethusina, em homenagem a sua esposa, Arethusa Pompéia de Miranda, irmã de Raul Pompéia, autor de “O Ateneu”. Político, Miranda foi ministro da Agricultura na presidência de Nilo Peçanha, senador estadual e chegou a disputar a sucessão da Província de São Paulo em 1912, perdendo as eleições para Rodrigues Alves por 1054 votos contra 64. Por suas relações, fez de Piracicaba um local de visitas e, especialmente, a própria fábrica onde várias das seções tinham, então, nomes de ilustres personagens republicanos como Deodoro da Fonseca, Julio de Castilhos, Quintino Bocaiuva e Campos Salles, entre outros. Foi em seu período que a fábrica iniciou a produção das famosas casemiras, introduziu reformas no maquinário e nas suas instalações.

vinheta 2 palacete

A indústria mudará novamente de mãos em 1918, já então uma sociedade anônima por iniciativa do filho de Rodolpho Miranda. A transação é feita com a “Boyes Irmãos e Cia.”, formada por Herbert James S. Boyes, inglês, que durante 12 anos trabalhara como gerente da “Cia. Industrial de São Paulo”, e Alfred Simenon Boyes. À época, já possuíam a Fábrica São Simão, em São Paulo, adquirindo, em 1928, a São Bernardo. A “Boyes Irmãos e Cia.” empregava, então, um total de 2500 funcionários, representando 6% do operariado do setor têxtil do Estado. Uma curiosidade, detectada pela pesquisadora: Herbert era casado com Elvira Sterry, filha do diretor técnico que Luiz de Queiroz trouxera da Bélgica pra dirigir a “Fábrica Santa Francisca”. Elvira nasceu e cresceu em Piracicaba, no próprio espaço da vila defronte a fábrica.

A grande crise da Boyes ocorre entre 1932 e a produção, em níveis normais, só seria retomada após o início da II Guerra Mundial, quando então ela se diversificaria também para as sacarias, além de brins e tecidos de duas larguras.

Até os dias atuais, a empresa permanece em mãos da família Boyes. Alfred Boyes foi o primeiro a falecer e sua parte foi transferida para a esposa, na forma de “metade do terreno e suas benfeitorias”. O restante foi deixado aos herdeiros de Herbert e Elvira, que tiveram quatro filhos. Arthur, foi morto durante a II Guerra e deixou sua parte a um sobrinho; Verginia, ainda viva, é casada com um ex-presidente da “Cia. Antarctica”; Kathleen, solteira, faleceu em 1991 quando ainda residia no Palacete Boyes e Doris casou-se com Norman Ford, que durante muitos anos dirigiu a fábrica.

Hoje, a presidência cabe a um dos filhos do casal, Peter, sócio majoritário em função da herança deixada pelo tio Arthur, e a David. Ambos residem em São Paulo.

 

 Para conhecer o texto completo, acesse a TAG Palacete Boyes

5 comentários

  1. Paulo Geovani em 21/03/2019 às 07:33

    Sou piracicabano e acompanho sempre seus textos tenho uma admiração pela historia de nossa cidade e sempre estou em constante pesquisa sobre tudo que nos trouxe até os dias atuais. Esse palacete é uma de muita curiosidades em saber como é por dentro se tem alguém ali, quem toma conta, quem são os proprietariados aonde residem. Gostaria de saber se é possível conhecer pessoalmente esse lugar que nos traz tanta curiosidade pela sua historia!

    • Patrícia Elias em 26/03/2019 às 18:09

      Olá, Paulo!
      Grata por sua leitura e pesquisa em nosso site!
      Infelizmente, não temos a informação sobre o acesso ao Palacete Boyes. Apenas que seus proprietários atuais são da Família Fioravante.
      abraço,

  2. Valdete em 03/06/2019 às 15:14

    Trabalhei 10 anos na Boyes . 1981 á 1991.
    Tenho saudades. Ainda sonho que trabalho lá. Bons tempos.

    • Helena Frasson em 25/07/2021 às 19:51

      Nasci nessa terra de Piracicaba há 58 anos. Acompanho Cecílio, admirando seus textos e sua pessoa. Quando professora tive o privilégio de convidá-lo para ser o palestrante da minha turma de alunos. Estudavamos personagens da cidade. As crianças ficaram por semanas falando sobre aquele senhor que tanta conhecia sobre Piracicaba e nossa admiração por ele e tanto conhecimento só fez aumentar. Muito grata Sr. Cecilio por nós proporcionar “essa viagem ao tempo” à nossa amada Piracicaba.

    • Mário em 07/09/2021 às 07:56

      Eu também trabalhei por uns três anos. Saudades. Lembra do lema da Boyes que você criou: Pra que facilitar se pode complicar .!! Mário

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