Sobre a mãe brasileira de Thomas Mann (1)
A vinda ao Brasil de um bisneto de Julia da Silva Bruhns, mãe do grande romancista alemão Thomas Mann, cujo livro “Cartas e Esboços Literários” está sendo lançado pela Ars Poetica neste momento, provocou alguns artigos e referências no Jornal do Brasil e na Folha de São Paulo, com informações parcialmente corretas, mas várias afirmativas inexatas, deixando também de lado a fase mais interessante da vida de Johan Ludwig Hermann Bruhns, pai de Julia da Silva Bruhns.
O próprio escritor contribuiu para criar alguma confusão ao escrever, em 1930, um curriculum vitae que o Ministério das Relações Exteriores da Alemanha divulgou, em 1955, uma plaqueta na Exposição Vida-Ambiente-Obra 1875-1955, realizada no Rio de Janeiro para homenagear o escritor.
Nesse curriculum vitae, o romancista afirma que a sua mãe era filha de um fazendeiro alemão e de uma brasileira de origem portuguesa-crioula. O crítico Gilson Ribeiro afirmou, na ocasião, que Julia da Silva Bruhns era uma brasileira gaúcha de origem portuguesa, e Anatole Rosenfeld, especialista em literatura germânica, garantiu que a mãe de Thomas Mann era uma caiçara de Angra dos Reis. Até mestre Gilberto Freyre, em sua monumental “Ordem e Progresso” fala de um Mann que não teria resistido aos encantos tropicais de uma sinhazinha brasileira de olhos romanticamente negros, casando com a iara e gerando o semi-brasileiro Thomas Mann.
Em reportagem mais recente para a Folha de São Paulo, Bernardo Carvalho diz haver Bruhns conhecido D. Pedro II, por ocasião de sua passagem pelo Rio de Janeiro, que o teria agraciado com os direitos de navegação fluvial dos Rios Tietê e Piracicaba, onde se instalou.
É duvidoso que um aventureiro alemão sem dinheiro ou títulos nobiliárquicos, como Johan Ludwig Hermann Bruhns, pudesse ter obtido, sozinho, privilégios reservados, no Brasil Imperial, para a casta senhorial, como em todos os estados patriarcais e patrimonialistas. O pão de ló do governo, como disse certa vez Delfim Moreira e Pedro Nava registra, é só para os amigos. O privilégio da navegação dos rios em questão foi concedido, na realidade, ao Senador Francisco Antonio de Souza Queiroz, futuro Barão de Souza Queiroz, e a João Germano Bruhns, pelo Decreto 5.250, de 24 de maio de 1873, dando origem à constituição da Companhia Fluvial Sul Paulista, cujos estatutos foram aprovados pelo decreto 5.405, de 11 de novembro de 1873.
(continua no próximo post)