“Não olhe para cima!”

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A Escola Agrícola, retratada em cartão postal. (imagem: acervo Cecílio Elias Netto)

Mudamo-nos de Brazópolis, Sul de Minas para Piracicaba, Centro Oeste de São Paulo nos idos de março de 1951.

Piracicaba sempre me fascinou, mesmo antes de conhecê-la de viso. Sim, Dona Sinhá era grande propagandista da, então, Florença Paulista. Contava-nos, com frequência, maravilhas de lá! Não me esqueço dela contando, cheia de orgulho que Piracicaba dispunha de doze Grupos Escolares ou que era cidade planejada, ou, ainda do magnífico Matadouro Municipal, “projeto de papai”! Das calçadas largas, ruas calçadas, das três “linhas” de Bonde (Escola Agrícola, Estação da Paulista e Vila Rezende), da Escola Normal “Sud Mennucci”, uma das melhores do País, que rivalizava com a “Caetano de Campos” de São Paulo! Falava sorrindo de glória dos dois cinemas e dois Teatros. E a “Escola Agrícola”, então! A melhor da América Latina! Onde seu pai era professor catedrático, com Cátedra Vitalícia, frisava!

E o Salto do Piracicaba…! Lembro-me da raiva que senti de Haroldo de Azevedo, autor do livro “Geografia do Brasil”! Adotado pelo Prof. Antonello, Catedrático de Geografia no já Instituto de Educação “Sud Mennucci” de Piracicaba, que citava o Salto do Rio Piracicaba, a primeira das “7 Maravilhas da Cidade” que “não passava de uma corredeira”! As outras 6 eram a Escola Agrícola, a Catedrar, o Véu da Noiva e os três “Semáforo”! E o traçado da cidade com ruas ortogonais de quarteirões quadrados com 100m de lado! Enfim, para nós, crianças, a cidade era a Oitava Maravilha do Mundo! Quando nos mudamos, fui conferir tudo e descobri novas maravilhas que me alucinavam e me cativaram, definitivamente!

Outra característica de Pira, para os íntimos, era seu comércio concentrado na parte central, mormente na Rua Governador Pedro de Toledo, que já fora “Rua do Comércio”! Lojas especializadas ficavam próximas, como as de caça e pesca (Casa da Chave, Casa Indiana e Casa Americana) minhas preferidas, as três no quarteirão da Prudente entre a Governador e a Santo Antonio, no mesmo lado da rua!

Havia dois cinemas: Broadway e São José e , os dois, próximos à Rua São José! Dois Teatros: Santo Estevão e São José, também à Rua São José. Mais tarde foram construídos mais três, todos à Rua Benjamin: Colonial, Palácio (depois de reformado passou a ser chamado de Rívoli) e o Paulistinha, depois do Pontilhão da Paulista. O cine Politeama, situado à Praça da Catedral. O sétimo veio bem depois, Cine Plaza, junto ao Comurba e com ele morreu!  Não consigo me esquecer do Clube de Ciências, idealizado e construído à rua Ipiranga entre as ruas São João e Bom Jesus, pertinho da casa em que moramos, à rua Bom Jesus. Era um belo salão cheio de animais empalhados (o Professor Diniz era excelente taxidermista e ensinou a técnica a diversos alunos), um belo Museu, onde às quartas havia sessão de cinema e aos domingos as deliciosas “Brincadeira dançantes”, o que ajudava sua manutenção. Seu idealizador e realizador foi o Professor Moacyr Diniz, magnífico Professor Catedrático de Ciências Naturais da Escola “Sud Mennucci”.

Mas, voltando ao Comércio, com lojas “pareadas”, como “Céu Cor de Rosa”, e “Céu Azul”. Um doce para quem adivinhar o que vendiam! E a Damaris não existia! Não me lembro se eram do mesmo dono, mas o da “Céu Cor de Rosa”, Jorge Chadad ficou gravado em minha memória. Por que? Por causa de sua inteligência! Vejam vocês, a loja, de “Armarinhos”, como se dizia não era pequena, muito menos, grande. A quantidade de produtos à venda era cada vez maior. Onde colocar? Creio que sua mulher e sócia, cujo nome não me recordo, sugeriu: vamos pendurar no forro. Um silêncio solene se seguiu! No domingo fizeram uma faxina digna de nota e, na segunda, o forro estava literalmente cheio de artigos para meninas! Algum apressadinho perguntou: quem vai olhar para cima? Jorge disse ao apressado palpiteiro: entre outra vez na loja. Ele saiu e viu a pequena tabuleta onde se lia: “Não olhe para cima!”. Olhar para cima era o que todos os fregueses faziam, sem hesitar! Não era uma pessoa muito inteligente? A curiosidade humana suplanta qualquer coisa, mormente se for feminina!

Pensaram que eu ia falar do filme? Engano! Não tenho nada a dizer do filminho americano, homônimo ao da inteligência comercial do piracicabano. Plágio? Pode ser! Sou louco por cinema, mas tenho especial e generosa implicância com americanos, mas gosto de Haward Hawkes e Quentin Tarantino!

Outra coisa que me extasiava era a existência de duas Estações Ferroviárias: a da Sorocabana e a da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. A segunda era uma concessão feita para a Inglaterra. Era Maravilhosa! Era costume do piracicabano conferir a hora certa com o apito da Paulista às “dez e dezessete”, quando chegava a composição de São Paulo. As duas se transformaram em FEPASA e, graças a JK, se acabaram!

* Jairo Teixeira Mendes Abrahão é professor titular da ESALQ-USP.

1 comentário

  1. Restanu em 22/04/2022 às 20:13

    Má ôE

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