Úlcera Perfurada

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Nascera no sítio, em Águas da Prata, município paulista próximo da divisa com Minas Gerais. Desde cedo, ajudara o pai, meeiro, na lida no campo. Plantavam batatas e hortaliças. Carlos Roberto Paulo de Moraes, o filho mais velho de oito irmãos, abandonara a escola para trabalhar na roça, aos treze anos, quando se viu responsável pelo sustento de toda a família, após a morte precoce do pai, aos 51 anos. Na mesma época, começara a fumar.

Sete anos após o início do consumo dos cigarros, poderia ter selado seu destino. Estava magro, tinha fome, mas, ao alimentar-se, sentia dores no estômago. Tomava remédios, e não melhorava. Faziam-lhe chás caseiros, mas o alívio era temporário. Um dia, acordara sentindo muito frio na barriga e percebera algo errado quando viu, no vaso sanitário, sangue talhado. Correu para o hospital mais próximo, na cidade de Vargem Grande do Sul, e foi operado às pressas — era um abdômen agudo por úlcera perfurada.

Problemas respiratórios, como a bronquite e o enfisema pulmonar, associam-se, facilmente, ao tabagismo, todavia, por outro lado, as pessoas desconhecem os problemas que ele pode causar ao estômago. As úlceras pépticas são um exemplo. Num podcast no Youtube do Paradas pro Sucesso, que gravei com o médico Ricardo Tedeschi, gastroenterologista de Piracicaba, ele conta que elas surgem do desequilíbrio da fisiologia gástrica. A nicotina causa a redução do fluxo sanguíneo na parede do estômago, da regeneração e da cicatrização das lesões. Ela também interfere na composição do suco gástrico, reduz a secreção de muco — que protege a parede contra o ácido — e do bicarbonato de sódio — substância alcalina que neutraliza o ácido estomacal —, culminando em desequilíbrio que pode causar a úlcera. Se não tratada, ela pode sangrar, ou perfurar a parede do estômago, com a instalação de uma emergência cirúrgica, que leva à mortalidade de até trinta por cento dos indivíduos.

O tempo passou e Carlos Roberto nunca fora alertado de que aquela doença que quase lhe tirara a vida, aos vinte anos de idade, fora causada pelo consumo dos cigarros. A oportunidade surgiu somente muito tempo depois, aos 62 anos, quando começou a se tratar comigo. Ofereci-lhe o tratamento contra o tabagismo e conseguiu parar de fumar. Sete anos depois, segue a vida livre de doenças.

*Dra. Juliana Barbosa Previtalli – médica cardiologista, integrante do Corpo Clínico da Santa Casa de Piracicaba; diretora científica da SOCESP regional Piracicaba; idealizadora do projeto antitabagismo “Paradas pro Sucesso”.

*Erasmo Spadotto – cartunista e chargista, criou a ilustração especialmente para este artigo.

A Província apoia o projeto e a campanha antitabagismo “Paradas pro Sucesso”. Para acompanhar outras crônicas desta série, acesse a TAG Paradas pro Sucesso.

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