Horário comercial e discussão obsoleta

picture (47)É incrível sejam, ainda, as mesmas, as polêmicas em torno do horário para funcionamento do comércio e abertura em feriados. A discussão não é, apenas, de Piracicaba e nem de agora. É de todos os lugares e de todos os tempos. Trata-se, ainda, da secular divergência sobre a jornada de trabalho e do conflito entre capital e o trabalho, em erupção desde a primeira revolução industrial. Nenhum eufemismo consegue negar o óbvio: o empregador quer pagar quanto menos para o maior número de horas de trabalho do empregado; o empregado quer trabalhar o menor número de horas, ganhando o máximo que puder.

A abertura do comércio aos sábados e feriados volta a discutir, na verdade, a chamada “semana inglesa”, que acresceu algumas horas do sábado ao descanso do domingo. Quando a novidade ocorreu, provocou crises gerais, em todas as partes. A busca desesperada por novos empregos atropelou convencionalismos antigos. Em Piracicaba, a discussão é enfadonha por não se arejarem os argumentos. De ambos os lados do conflito, há idéias preconcebidas e engessadas, que ecoam desde a década de 1960, como se vivêssemos à parte das mudanças tecnológicas que atingiram o mercado de trabalho, alterando a estrutura da indústria, comércio e serviços.

A disciplinação das horas extras foi a tentativa de permitir mais contratações. Alterar o horário comercial foi outra, mesmo porque, com os novos tempos, a forma tradicional de comerciar está ameaçada senão de morte, pelo menos de doença perigosa. Há, porém, quem não entenda ou finja não entender, como que alheios às novas tecnologias que conduzem à mesma tragédia das mudanças tecnológicas anteriores: desemprego em massa, miséria crescente, conflitos sociais.

Hoje, a realidade é ainda mais grave, pois os novos referenciais tecnológicos e gerenciais não geram emprego. Há mais produção, mais consumo e menos trabalho. O decantado surgimento de uma “civilização do lazer” alcança a poucos e a realidade é amarga: com menos trabalho e menos emprego, há o desespero e a miséria em nível universal.

Por isso, é lamentável a arenga piracicabana. Novos tempos exigem novas soluções. Para isso, há que se ter abertura a idéias também novas. A força de trabalho é outra e outras, as técnicas: da Antigüidade ao século 18, foram a água, a madeira, o vento; depois, carvão, ferro e vapor. Em seguida, petróleo, eletricidade, ligas metálicas. E, agora, energia nuclear, telemática, informática. Técnicas sofisticadas diminuem o esforço e o trabalho humanos.

Estão ameaçadas as formas tradicionais de comércio. Quando mais se fragilizam, mais se agudizam a miséria e o desemprego em massa. Discutir lantejoulas é questão bizantina. E é o que ainda se faz em Piracicaba por parte de alguns grupos, discutindo fórmulas obsoletas e superadas. Piracicabanos já compram em outras cidades e, mais do que isso, em outro universo tecnológico. O povo está atropelando o comércio convencional, diante de outras e novas opções como lojas virtuais, internet, shoppings que alteram estruturas antigas. Sem povo não há comércio.

Por isso, horário comercial é questão de sobrevivência. E a discussão apenas será fértil se houver um mínimo de solidarismo, avaliando-se a dimensão social e não apenas econômica do trabalho. O desafio é grande. Pois o empresariado coloca o econômico acima do social e os sindicatos são de empregados e não de desempregados. O conflito entre capital e trabalho permanece egoísta como nos primórdios.

A telemática e a informática mudaram o mundo, pessoas, relações de trabalho. Isso exige novas maneiras de pensar. Será ridículo, hoje, pensar ao ritmo da máquina a vapor. Mas há quem insista nisso. Da mesma forma como muitos ainda pensam como se a Terra fosse plana. Bom dia.

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