O talento de Eugênio Nardin

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Oficina de Eugênio Nardin – quadro de Eduardo Borges de Araujo

Esse texto foi publicado em agosto de 1988 no semanário impresso A Província. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

Eugênio Nardin é o mestre no entalhe de Piracicaba. Marceneiro a toda obra, fazer arte utilizando a madeira como matéria-prima sempre foi a paixão de sua vida. Um trabalho que vem de duas gerações passadas, e que hoje, aos 68 anos de idade, ele ainda exerce. Utiliza-se do bom gosto, da experiência e da paciência, como suas fortes armas. Mas o que mais conta para Neno, como é chamado pelos amigos, é a sua criatividade, um dom que lhe permite desenvolver a sua arte, com o uso das mãos, da cabeça e não deixando de lado o coração.

Neno é o apelido que não sabe dizer de onde veio. Pode ter sido dado por um de seus irmãos menores; ele foi o quinto filho de um total de nove irmãos. E todos os filhos homens — conta ele — seguiram o mesmo caminho: a marcenaria. Afinal, já era tradição da família – seu avô, seu pai e tios trabalhavam com isso, e há muito. “Tenho impressão que o desenvolvimento já é centenário”. Seu avô trabalhou muito tempo como montador de máquinas agrícolas, em engenhos de café. Paralelamente levava em frente uma indústria de móveis, na Rua do Comércio, hoje Governador.

Ele comenta que o trono do bispo da cidade e as banquetas, também entalhados, foram presentes para a cidade ainda no tempo de seus tios. “Além disso, fizeram a urna do santuário, usado na sexta-feira santa”. Na Igreja das Carmelitas, foi o responsável pela fabricação e o entalhe das portas também. Alguns trabalhos, ele chegava a cobrar. “Logicamente eu fazia um preço melhor”, esclarece.

Nos estudos, Neno completou a escola de contabilidade, atividade a que nunca foi muito ‘ ‘chegado”. O “ser” marceneiro aprendeu na prática. ‘ ‘Comecei a parte de entalhe com meu tio Paulo, e isso já faz 32 anos”. Mas é de entalhador que gosta de ser chamado e reconhecido; não de marceneiro. Neno já fez o diabo em madeira. O diabo também é exagero, aliás sempre foi — e até hoje ainda é —- grande contribuidor nas igrejas e capelas da cidade. Praticamente em todas, há um dedinho, ou mais, seu.

PRESENTES PARA PIRACICABA

Para começar a numerar, parte da Catedral, nesta nova fase, evidentemente. “As portas da igreja foram feitas e entalhadas por mim. Lembro-me da colaboração da firma Gobet e de Sorocaba, de desenho e pintura. Fiz o curso para ter uma melhor base para desenvolver ainda mais o meu trabalho”. Logo  começou a contribuir no mercado da arquitetura e da engenharia civil. “Na época não tinha arquitetos, não havia quase nenhum desenvolvimento nesta área. O que eu fazia eram desenhos e projetos de igreja”.

Seu primeiro projeto foi o da Catedral do Alto Solimões, uma igreja do Amazonas, trabalho desenvolvido com Frei Alberto, um capuchinho. “Em Piracicaba contribuiu muito com o Dr. Salgot nos desenhos da Igreja do São Dimas e também na Igreja do Coração de Maria. “Fui o responsável pelo batistério da igreja.

Atualmente ele está orientando a pintura da reforma da Igreja do São Benedito. Não há muito tempo, sugeriu essa nova pintura do Cemitério. “Sempre procuro atender os chamados da Prefeitura. A gente dá opinião, eles aceitam”. Aluno de Frei Paulo Maria de Sorocaba, lembra que fez o báculo do primeiro bispo que veio para Piracicaba, Dom Ernesto de Paula. “O báculo de Dom Aniger também é trabalho meu”

Destaca ainda os feitos na casa de recepção de Monte Alegre. “Aquela Casa bonita de arco logo que passa a fábrica, do lado direito”. Todas as portas em estilo colonial, o teto em madeira com florões, os lustres, as arandelas, sempre entalhados, foram obras do mestre. .

Faz questão de falar da grande ajuda recebida de seu mano Hélio em todos esses anos. “Trabalhamos juntos de 1946 até 1980. Eu e o Hélio sempre tivemos uma vida em comum”, conta. E os outros irmãos? “Cada um foi para um lado mas todos mexendo com móveis”. Na época de seu avô, lembra que não existiam muitos concorrentes. “Acho que tinha o Zara, o Paschoal Guerrini, o Sansígolo. Depois é que apareceram mais. O Passini e o Simoni foram empregados do meu pai’

OUTRAS ARTES

Neno é figura fácil em outras cidades também. Já prestou serviço em Santos, São Paulo e Rio de Janeiro. E não só pelo trabalho de entalhador é conhecido. O fato de participar praticamente em todos os Salões de Artes Plásticas de Piracicaba, fez com que seu nome fosse conhecido aí fora. Atualmente expõe no atual Salão de Belas Artes da cidade, e está com um trabalho exposto em São Paulo, em comemoraçãoo aos 50 anos do Salão Paulista.

Ele utiliza a técnica de pintura a óleo como a principal, mas não despreza os desenhos a carvão e a pastel. Tem verdadeira fascinação por pintar do natural e explorar a figura humana.

Da infância, diz não sentir saudades de quase nada. “’Eu vivo o dia de hoje. Não penso muito no passado”. Talvez tenham ficado guardadas na memória as horas e horas que passou tocando violino com seu parceiro, o Frei Paulo. “Tenho grandes lembranças daquele dueto que formávamos. Nem sentia o tempo passar”. A propósito, estudou violino desde os 14 anos de idade e fez parte da Orquestra Sinfônica de, Piracicaba junto como maestro Vandembrandi. Tocou também com a Orquestra de Piracicaba quando Benedito Dutra era o regente. “Fiz parceria com Olênio Veiga, com o Arlindo Porto e com o Dácio Souza. Formávamos uma orquestra de amadores”.

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