A HISTÓRIA QUE EU SEI (LXX)

A campanha explosiva
A batalha eleitoral travada entre Salgot Castillon e João Guidotti parecia um barril de pólvora que explodiria se qualquer chama chegasse mais perto. A radicalização chegara a um nível quase insuportável: de um lado, os “guidotistas”, explorando o cadáver de Luciano Guidotti, denunciavam a “demagogia” de Salgot e o seu estilo populista de fazer política e de administrar a cidade. do lado “salgosista”, evitava-se falar em Luciano, mas se tentava provar que João Guidotti era um homem pouco sensível ao povo, além da exploração das graves dificuldades financeiras porque passava a empresa dele. Duas pessoas se destacavam no comando da campanha de Salgot Castillon: o ex-prefeito Alherto Coury e o ex-vereador Geraldo Carvalhaes Bastos. Na campanha de João Guidotti, o jornalista Maurício Cardoso e o vereador Francico Antonio Coelho, então na presidência da Câmara.

Até o último dia de campanha, a disputa entre os dois candidatos foi palmo a palmo, como que se repetindo o que o IBOPE houvera detectado antes, quando dera ligeira vantagem para Humberto D’Abronzo em Fevereiro. Alberto Coury trabalhava com duas informações sobre as tendências da opinião publica uma, a real, servia para orientação da campanha e, nesta, Salgot perderia por pouca margem; outra, para efeito de divulgação, em que o perdedor, também por pouca margem, seria João Guidotti. Na realidade, sabia-se que a imagem de Luciano Guidotti. Já transformado em mito, era decisiva para o resultado daquelas eleições: João Guidottti que nunca tivera qualquer experiência eleitoral, estava herdando o espólio eleitoral de seu irmão, sendo inútil a ênfase que os “salgosistas” davam ao fato de outro irmão de Luciano, Luiz Guidotti, estar apoiando Salgot Castillon junto com os “ademaristas”.

Um incidente quase radicalizou ainda mais a campanha de 1960: a indicação de Cássio Paschoal Padovani, conhecido advogado e contador que era também presidente da Telefônica Piracicaba – como candidato a vice prefeito de Salgot Castillon. A indicação fora feita pelo deputado Domingos José Aldrovandi, num acordo dentro da ARENA: os “ademaristas” apoiariam Salgot, mas indicariam o candidato a vice-prefeito.

Cássio Paschoal Padovani era um homem de honestidade pessoal inatacável, mas de um temperamento difícil, um estilo radical. Cássio Padovani aceitou a indicação mas, antes de fazê-lo, enviou uma carta – ao estilo do que fazia seu antigo líder político, o deputado Valentim Amaral – com alguns pontos que deveriam ser aceitos por Salgot Castillon. Era uma carta agressiva e, nela, Cássio Padovani praticamente repetia tudo o de que Salgot Castillon era acusado pelos adversários: não deveria “haver clientelismo, empreguismo, populismo, demagogia na administração”, etc. A situação em que Salgot Castillon se viu colocado foi das mais difíceis se não aceitasse o teor e o nível da carta, haveria novo rompimento dentro da ARENA e os adversários poderiam dizer que a sua administração seria mesmo demagógica clientelista, etc., se aceitasse a carta, teria que engolir um sapo do tamanho de um elefante Salgot Castillon engoliu o sapo, mas os “guidotistas” estavam informados do teor da carta e aquilo se transformava em mais uma arma política contra Salgot Castillon. A tese era simples: ao estilo de

Luciano Guidotti, os “guidotistas” seriam grandes administradores se fossem eleitos; Salgot, se eleito, seria o exercício da politicagem na Prefeitura.

Para se avaliar o equilíbrio de forças eleitorais, basta dizer-se que, no último dia de campanha, Alberto Coury tinha o resultado de uma pesquisa de opinião dando a vitória, por diferença mínima, para João Guidotti. E a apreciação da tendência do eleitorado era clara: no centro da cidade e nas áreas mais urbanizadas, o “guidotismo” era como que imbatível. Salgot Castillon continuava liderando na zona rural, distritos, periferia. E um dos locais que seria decisivo para as eleições era a rua Moraes Barros, um centro nervoso do eleitorado. À véspera da eleição, Salgot Castillon usou, mais uma e pela última vez, o seu estilo pessoal de fazer política, o da visita pessoal, o do encontro direto com os eleitores. Começou de manhã, percorrendo a Rua Moraes Barros da rua do Porto até a Avenida Independência, visitando casa por casa de eleitor; retomou pela outra calçada, no sentido inverso, da Avenida Independência até a rua do Porto. E reverteu a situação.

Quando se abriu a primeira uma para a apuração dos votos, Geraldo Carvalhaes Bastos – nomeado Delegado da ARENA – tinha, debaixo dos braços, pedidos para impugnar todas as umas, uma a uma, sob a alegação da inelegibilidade de João Guidotti, baseada em parecer jurídico que o tinha por impedido de candidatar-se pelo fato de pretender o mandato subsequente ao do próprio irmão. Não foi preciso fazer a impugnação. Em primeiro lugar porque Salgot Castillon, como candidato, proibira o partido de usar de tal recurso, ainda que legal e legítimo. E, em segundo, porque a vitória de Salgot, sobre o adversário que representava o “guidotismo”, se foi revelando nítida, uma a uma.

Novos vereadores elegiam-se, entre eles Gustavo Jacques Dias Alvim, Guerino Trevisan, Homero Paes de Athayde, Romeu Ítalo Rípoli, todos eles que viriam a ter posição de destaque na política dos próximos anos em Piracicaba. E havia, na ARENA, uma tônica em relação à Câmara Municipal: a derrubada de Francisco Antonio Coelho da presidência da edilidade, acusado que Coelho vinha sendo de empregar “funcionários-fantasmas”. Romeu Ítalo Rípoli passava a ser uma voz incansável contra Francisco Coelho, mal sabendo, porém, que o fato de ter sido favorável ao golpe militar desde a primeira hora e de pertencer à ARENA, não lhe dava vantagens diante do MDB de Piracicaba, um partido com forte apoio na área militar, como se veria depois.

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