Afinal, o que quer a mulher?

Pergunta que não se desgasta é essa do querer feminino. Uma investigação de longa data, delineada de inúmeras formas, mas sempre atual e permeada de mistérios.Mulher! Essa coisa que “escapa” a qualquer entendimento. Talvez possamos pensar esse querer a partir de uma digressão pelo Reino do Rei Arthur, um relato mitológico que nos dará a dimensão daquilo que queremos focar aqui.

O Rei estava à beira da morte, seu reino arruinado pela estiagem e entregue à desolação total devido à magia negra. Um dos cavaleiros, no entanto, descobriu o antídoto e imediatamente se dispôs a ir em busca da salvação Real. Tratava-se de consolidar bodas de casamento com uma figura detestável, horrorosa, animalesca que vivia na floresta. Imediatamente, após descobrir ser esse o antídoto para a magia, ele se embrenhou floresta adentro e, sob o temor e a expectativa de todo reino, trouxe consigo a figura mais deplorável, jamais vista, para tornar-se sua esposa.

Chegou ao reino e, diante de risos e condolências, no instante em que pisaram o chão o Rei sarou e tudo em sua volta ganhou viço – vida. Grande festa, banquete nupcial e noiva descomposta, desgrenhada nos cabelos, unhas e gestos… No entanto, o gentil cavaleiro tratou-a como a uma dama. No momento em que se retiraram para os aposentos nupciais, ao transpor a porta, outra magia se dá a ver: A fera transforma-se na mais bela das mulheres. Diante do olhar de admiração do marido, ela lhe pergunta se ele a quer bela de noite, só para ele, e horrorosa de dia no convívio social, ou ao contrário, linda no convívio e horrorosa para ele a noite.

E é aí que poderemos entender a magnitude de uma alma nobre. Ele responde com uma outra pergunta. Ele quer saber como ela é. Como se sente melhor. Então ela pôde se dizer! Ali estava alguém que queria ouvir, que olhou para ela, que a deixou existir. E aí ela disse que seria bela de noite e bela de dia!

Estava feita a maior das magias! Ao alcance de quem tiver olhos de ver e ouvidos de ouvir.

Quantas vozes estranguladas nossas mulheres carregaram na forma de sintomas, como a histeria lá atrás, e a anorexia, aqui tão próxima .

Vivemos uma cultura que abriga o grande mal do século, aquele que escraviza as mulheres deixando-as pensarem serem elas apenas um corpo a ser admirado. A mulher quer ser desejada sim! Mas ser desejada pelo que ela é! Só que, infelizmente, ela não sabe dizer o quê ela é. Ela não sabe dizer o quê ela quer! Mas sai por aí querendo receber o que falta. E essa falta é tão anterior a tudo que nada pode preencher, só que ela não sabe disso, preocupada que está em “manter a forma”. Falo de esculturas vazias, mesmo porque as de Camille Claudel não se encaixam aqui. São cheias de sentido.

A mulher do cavaleiro andante teve o que, acredito, toda mulher almeja ter: a soberania! que podemos traduzir também como a voz. Aquela voz que diz dela, mas que ela nunca teve a coragem de dizer.

Tanto já se alcançou ao longo dos tempos mas o mistério do querer feminino ainda parece ser mito, conhecido apenas por algumas figuras corajosas na maneira de expressar o desejo, de ser mulher desejada.

*Elaine de Lemos Elias é professora e psicanalista

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