Nota explicativa

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images (25)Recebi um e-mail lindo perguntando que apito eu toco. A-do-ro! Acho que é por causa da mistura de temas. Que apito, essa é boa. Eu toco o meu apito.

Devo tocar uns apitos que incomodam. Por que haveria de tocar um só? Já pensou? Aquele apitinho monótono, aquela flautinha canhestra, um monocórdio chato, um diapasão repetitivo?

Estou fazendo umas ligações nada clandestinas para concluir que devo ser uma índia aqui de Piracicaba, nome que, em bom tupi-guarani, quer dizer “lugar onde o peixe para”. Desculpe se for só tupi. Ou só guarani.

Enfim, o nome Piracicaba é de origem indígena. Lugar onde o peixe para. Esse “para”, em sua forma verbal, perdeu o acento agudo na reforma ortográfica. Pois deveria continuar acentuado, diferenciando-se do “para” preposição. Esses gramáticos e filólogos e suas reformas!… Talvez nem entendam de rio, de peixes e onde eles param. Rubem Alves já disse que “o mundo dos escritores não é o mundo dos gramáticos”.

Penso que tocar vários apitos requer até alguma habilidade. Olha, que modesta. Nunca tomei aulas. Já devo ter nascido com esta predisposição para ousar. Ou para apitar. Adolescente, eu levava um apito no estádio para assistir aos jogos de basquete do XV de Piracicaba, no glorioso tempo de Wlamir, Pecente, Waldemar, Zé Carlos e Mané.

Já apitei jogo de vôlei e me saí bem. Estava de férias num hotel em Águas de Lindóia e arbitrei para um grupo que se inscreveu numa partida com um astro deste esporte (cujo nome agora me foge). Meu lindo jogou e o time dele ganhou. Mas fui justa e correta, apitei com isenção. Não favoreci o lado dele e marquei bem as infrações.

A dois parágrafos acima, usei o verbo “ousar”, mas poderia ser também “transgredir”, que é coisa adorável quando não se leva a vida a sério demais. Ora, minhas transgressões são tão meigas. Tudo muito inocente e fácil de livrar a cara. E eu sou lá besta de me meter em encrenca?

Então, preciso pensar que apito eu toco. Modestamente, diria que alguns. Interesso-me por Escatologia, a ciência que trata da consumação do tempo e da história e traduzo, do inglês, matérias proféticas acerca do fim dos tempos, repassadas a uma multidão. Também canto um pouco. Já cantei com orquestra em festival de música aqui na cidade. Tem até o disco gravado. Sou metida a poeta. Toco violão, componho, gosto de guarânias, daquelas bem fundas e sentidas, como “Ipacaraí”, “Gracias a la vida”, “Índia”, “Anaí”. Olha a mata, a zarabatana!

De resto, já toquei até pandeiro e ainda toco campainha, como todo mundo. É isso. Hoje, mais do que em qualquer outra época, temos de ser multidisciplinares. Versáteis. Ecléticos. Pluralistas. Abertos ao conhecimento e à informação.

E toca o barco, como se diz aqui em Pira. Bem eu que já fui tocada pela dor. No meio deste poema existencial, toca-me agora descobrir que apito eu toco, afinal.

E você, leitor, que apito você toca?

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