Para os que dormem tarde

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Penso que deve haver algo de muito importante na vida de quem dorme tarde. Eu durmo tarde e sei de um batalhão de gente que também não vai para a cama antes da meia-noite. Leio sempre relatos de escritores, artistas, noctívagos em geral, de pessoas comuns que não conseguem dormir cedo.

É como se o dia precisasse de mais horas e a noite não fosse nenhum obstáculo para continuar o trabalho, a lida, o estudo, a pesquisa, o ato de criar e produzir. Para muitos, a noite é propícia para a criação, sobretudo a literária. No silêncio noturno, as frases brotam espontâneas e belas. Ou devastadoras; depende.

Que hábito é esse de dormir tarde? Penso sempre no grande mistério do sono. Por que dormimos? Vemos em nós mesmos os estragos de uma noite mal dormida, ou de quando, por alguma razão, precisamos ficar de vigília. Sim, basta uma noite insone e acordamos com olheiras, de um jeito que não queremos nem nos olhar no espelho.  Por isso, as modelos lindíssimas afirmam que a melhor maquiagem é uma noite de bom e profundo sono.

O sono é fundamental para a saúde. Depois de um dia exaustivo, tanto para a mente como para o corpo, existe algo melhor do que um banho quente, um creme hidratante para a pele e lençóis aconchegantes? Para mim, não há. Se estiver disposta, ainda faço um chá destes que induzem ao sono.

O que é o sono? Por que dormimos? E por que vamos dormir depois da meia-noite? Somente pode desfrutar do luxo de dormir tarde quem não precisa levantar cedo. Verdade. Mas não levanto muito tarde, não. É como se meu ritmo biológico já tenha se habituado a uns horários meio irregulares e vai se adaptando bem a eles.

Lemos que o ideal são oito horas de sono. Mas nota-se que, com o passar do tempo, a necessidade de sono vai diminuindo. Assim, mesmo dormindo relativamente tarde, acabo acordando num horário bom, que me permite aproveitar parte da manhã para uma caminhada, tomar um pouco de sol no meu quintal, enfim, começar o dia com disposição e ânimo.

Aproveito as horas noturnas com gosto. Rezo, escrevo, medito, faço algo que acalme meu coração. Com a inquietação de sempre, resolvo sair lá fora e espiar o céu de dezembro. Este céu natalino que brilha para mim às duas da manhã, as estrelas tremeluzindo distantes. Onde está você?

Onde está você, meu lindo? São sete anos da sua partida e não dá para esconder a dor desta separação tão triste. Depois que você se foi, passei a dormir tarde, quando ainda morava na nossa chácara do Campestre. Lá, de madrugada, sem medo de sapos na varanda, nem das aves noturnas, sentava-me no “nosso banco”, pedindo que me ajudasse a voltar para a cidade.

Neste banco, em tantas meias-noites, me perguntei “onde está você?”. E sob o céu que nos protege, pedia uma luz, uma bênção divina, um venturoso ano novo, destes que esperamos com a alma em chamas. Era sempre tarde quando eu me recolhia, para continuar sozinha a oração que nunca termina.

Para os que dormem tarde dedico este texto. Para os que amam os humores das horas passando, o mapa da noite abrindo nossos olhos, a contemplação sublime do mistério e a paz do sonho.

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