Sem perder a ternura

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virtualA poesia pede passagem. Concedo-lhe. Amar o perdido também deixa confundido este pobre coração. As coisas tangíveis, disse o grande poeta, tornam-se insensíveis à palma da mão. Mas as coisas findas / muito mais que lindas / estas ficarão. Eterno Drummond.

O livro do Eclesiastes, da Bíblia, vem em meu socorro: “Tudo é vaidade e vento que passa”. E a vaidade do homem enredado na internet? Cheguei aonde queria. O computador, os aipedes da vida e tudo o que nos conecta com o mundo num piscar de olhos.

Houve um tempo em que abominei esta tecnologia, beijando os indicadores em cruz, jurando jamais sucumbir ao frio apelo da modernidade. Máquinas e eu somos de uma incompatibilidade mortal.  Até para operações no caixa eletrônico me atrapalho toda e acabo pedindo ajuda à moça do banco.

Maravilha era ter uma Olivetti Lettera 32 cor-de-rosa, julgando que um texto saído da máquina de escrever tinha mais alma? Penso em nossos pais, avós e bisavós, que não tiveram computadores em suas casas e viveram tão bem. Ora, conheço pessoas que ainda sobrevivem sem celular.

Enfim, as exigências da vida moderna nos obrigaram a capitular e a sucumbir.  Cérebros eletrônicos constituem uma concepção destinada a quê? A melhorar a vida das pessoas, certamente. A comunicação de hoje é algo fantástico, embora se questione se esta tecnologia teria eliminado de nós a emoção. E se a nossa solidão não seria ainda maior…

Mas um e-mail de amor, ou de amizade, vem recheado de beijos, corações e flores. Rendo toda a minha mais profunda admiração ao carinho virtual, à nova linguagem, às cifras e formas de expressão, às mensagens e sua arroba indefectível.

Sim, enterramos a máquina de escrever, a caneta-tinteiro, o bonde, o leiteiro das manhãs. O dinheiro virou um cartão de plástico, cuja senha não pode ser esquecida e o que mais temos na vida hoje é isso: senhas para decorar. Haja memória!

Vejo multidões digitando uma maquininha, as expressões absortas, perdidas, distantes. O mundo pode acabar e eles estarão ali, sérios ou rindo, mas concentrados, passando com o dedo indicador sobre a tela, arrastando imagem após imagem, num gestual que tomou conta do mundo, dos pequeninos até os mais idosos. A humanidade se encantou com esse brinquedinho.

A crônica ainda se espreme. Passou por um processador de texto e chegou até aqui. Não parece exausta, tampouco perplexa. Apenas viu como  as palavras fluem rápidas no teclado ágil e necessário.

O que é necessário, meus caros? Que não se percam o sentimento e a emoção. Que ainda reste um pouco do romantismo e do lirismo de outros tempos, embora embalados na tecnologia do assombro.

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