Universidades estaduais: crise de gestão ou de financiamento?

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gestao-financeiraRecentemente a Universidade de São Paulo, mais conhecida pela sigla USP, apresentou a proposta de contenção das despesas com pessoal a um limite do repasse das verbas que recebe por mês. Esses recursos repassados correspondem  a uma parcela, um percentual, da arrecadação do ICMS, Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços. Tal tributo é pago por todos os contribuintes cada vez que consomem uma mercadoria. Está no preço do produto. Quem recolhe são empresas, mas a conta é paga por todos nós. Sendo assim, os financiadores da USP, e também da UNESP e da UNICAMP, as três Universidades do Estado de São Paulo, são todos aqueles que consomem produtos paulistas.

A regularidade dos repasses para essas três Universidades é rígida desde 1986. Igual aos Municípios paulistas as Universidades se beneficiam de parcela significativa (9,57% da arrecadação do ICMS) e de autonomia financeira, pois os recursos são repassados de forma automática em todos os meses do ano. No caso dos Municípios, porém, tanto a parcela quanto a autonomia encontram na Constituição Federal amparo. Para as Universidades estaduais essas condições de financiamento são aprovadas a cada ano. Sendo assim, em algum momento poderemos ter toda essa situação suprimida com certa facilidade. Basta em algum ano não haver aprovação no Orçamento do Estado de São Paulo do percentual de 9,57% do ICMS para o repasse. Se hoje as três Universidades recebem aproximadamente R$ 8 bilhões em parcelas regulares ao longo do ano, o que garante um bom fluxo financeiro para as suas despesas, isso poderá deixar de ocorrer de um ano para o outro.

Alguns hoje advogam que está faltando dinheiro para essas três Universidades. Isso porque as folhas de pagamento estão em valores superiores ao do total do repasse. Sendo assim, segundo esses, o Governo do Estado deveria aumentar o valor do dinheiro transferido para as Universidades. É a linha de raciocínio similar a daquele que tem o seu salário inferior ao de suas despesas e logo pensa em aumentar a sua renda. No entanto, os tempos atuais não permitem a essa alternativa. Há uma forte recessão econômica e sem sinal no horizonte de melhora significativa. A alternativa então é a de ajustar-se a falta de recursos, ou seja, gastar menos e só naquilo que é essencial.

Foi dessa forma que a USP já aprovou ajustes em suas despesas. ocorreram já programas de demissão voluntária e a aprovação de um ajuste de suas despesas no longo prazo. A ideia básica é a de manter as despesas de pessoal compatíveis com o repasse dos recursos. Isso poderá permitir futuros reajustes salariais, contratações de docentes e servidores técnico administrativos, novos investimentos e a manutenção de seu patrimônio.

Parece ser razoável assim proceder, pois, é mais seguro controlar seus gastos do que almejar receitas cada vez mais escassas. Um pai ou uma mãe, por exemplo, para aumentar a sua renda familiar pode pensar em outra fonte de renda e buscar fazer algum trabalho extra, que é o que tem acontecido com a maioria da população trabalhadora deste nosso país. Mesmo que tendo que sobrecarregar suas atividades privando-se de lazer e convívio familiar, o aumento de rendimentos compensará por uma melhoria nas condições econômicas familiares. Outra alternativa é a de cortar gastos, mas, quem sobrevive com renda baixa não poderá fazer isso. Não existe no que cortar.

Esse dilema não é o mesmo das Universidades. Primeiro porque essas não geram sua própria renda, a obtém dos impostos, ou seja, os outros a financiam. É esse o ponto crucial: o que deve ser feito com a devida responsabilidade quanto aos recursos dos outros? Ficar exigindo aumentos dos repasses ou entender que esses aumentos não devam ocorrer é na verdade um falso dilema. Mesmo que houvesse opulência, estivéssemos com recursos em abundância, deveríamos igualmente usar com extrema responsabilidade nossos recursos. Houve tempo de vacas gordas, agora elas estão magras e o pasto está seco. Só agora estamos compreendendo, pela falta de dinheiro, que estivemos, assim como a cigarra na fábula, agindo sem nos preocupar com o amanhã. Nosso problema é que não há formiguinhas laboriosas para nos acolher no inverno. Seremos nós mesmos que deveremos resolver o problema. É possível terceirizar serviços, mas responsabilidade jamais.

*Alvaro Guedes é professor da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp de Araraquara.

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