Em 1987: E agora, Drummond?

O texto abaixo foi publicado em agosto de 1987 no semanário impresso A Província. Falava sobre a morte e trajetória de Carlos Drummond de Andrade. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

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Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro. 
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. 
Entre eles, considero a enorme realidade. 
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

O poeta Carlos Drummond de Andrade morreu aos 84 anos no último dia 17 de enfarte do miocárdio e insuficiência respiratória, no Rio de Janeiro, doze dias após a morte de sua única filha, Maria Julieta. Drummond havia deixado para a viúva Dolores uma instrução simples: nenhuma ostentação e nenhuma cerimônia religiosa.

A TRAJETÓRIA DO POETA

Drummond nasceu em 31 de outubro de 1902 em Itabira do Mato Dentro, MG, conhecida por seu minério de ferro. O primeiro prêmio como escritor foi a ficção “Joaquim do Telhado”, publicada na Novela Mineira de Belo Horizonte, em 1922.

A família fixa residência nessa cidade e o cronista, paralelamente ao poeta, inicia de fato sua carreira colaborando regularmente para o Diário de Minas — órgão do Partido Republicano Mineiro, que dominava a política estadual e dava as cartas no Brasil — de B. Horizonte, e para as revistas Ilustração Brasileira e Para Todos, do Rio de Janeiro.

Em 1923, o estudante retoma suas atividades prestando o vestibular e matriculando-se na Escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte. Ao mesmo tempo, o poeta mantém correspondência com Manuel Bandeira e contato com Blaise Cendrars, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral.

A vida da intelectualidade brasileira dos anos 20 é marcada pela ” fermentação modernista”, que também chega a Minas. Em 1925, Carlos Drummond de Andrade, juntamente com Martins de Almeida, Emílio Moura e Gregoriano Canedo, funda A Revista, órgão modernista do que saem três números e onde o grupo mineiro propõe a reformulação os padrões estético-literários brasileiros.

Nesse mesmo ano o poeta se casa com D. Dolores Dutra de Morais e conclui o curso de Farmácia. Entretanto, por iniciativa de Alberto de Campos, Drummond volta a BH para ser redator e, em seguida, redator chefe do Diário de Minas.

Em 1928 nasce sua filha Maria Julieta, ao mesmo tempo em que o poeta se torna “pedra de escândalo” quando a Revista de Antropofagia, de São Paulo, publica em julho seu poema “No meio do caminho”. O “homem-de-jornal” passa a ocupar espaço constante no Minas Gerais, órgão de BH. Sob o pseudônimo de Antonio Crispim, escreve sobre o cotidiano da capital mineira durante três anos.

Em 1930 CDA lança “Alguma Poesia”, sua primeira obra. A atuação do jornalista prossegue no Minas Gerais, A Tribuna, Estado de Minas e Diário da Tarde. Em 1934 Gustavo Capanema, novo ministro da Educação e Saúde Pública, traz Drummond consigo para o Rio de Janeiro como seu chefe de Gabinete.

No Rio o jornalista continua suas atividades, porém é o poeta quem começa a década de 40 com “Sentimento do Mundo” de cuja obra foi extraído o verso que inicia esta matéria. O servidor deixa a chefia do gabinete de Capanema e passa a chefe da Seção de História da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. O intelectual empenha-se na campanha pela anistia, em 45, e em 49 pela escolha de uma direção apolítica na Associação Brasileira de Escritores.

Na década de 50, Drummond produz textos como ficcionista, cronista, jornalista e cronistapoeta (“Versiprosa” e “Versiprosa II”). Em 1962 aposenta-se como funcionário público mas dá continuidade às atividades literárias e intelectuais jornalísticas.

Os anos 60-70 confirmaram a força expressiva do poeta e sua aceitação perante o público e críticos. Surgem, por exemplo, “Lição de Coisas”, “Antologia Poética”, “José e Outros”, “Boitempo” e “A Falta que Ama”. O cronista colabora ainda nas revistas cariocas Mundo Ilustrado e Pulso, transferindo-se em fins de 69 do Correio da Manhã para o Jornal do Brasil.

Em 84 Drummond para de escrever crônicas, modo como exercia o jornalismo diário. Escreveu 44 livros e teve sua obra traduzida em diversos países; a Editora Record publicará em breve o inédito “Avesso das Coisas”. Itabira decretou luto por três dias.

A província e A PROVINCIA também estão chorando.

 

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