A HISTÓRIA QUE EU SEI (112)

Piracicaba passou a falar e a ouvir falar de uma “República Socialista de Piracicaba”, tais as mudanças que se processavam na administração, ainda que de forma caótica, empírica e desorganizada. Criticável ou não, o fato é que o nome de Piracicaba passou a ser conhecido em todo o pais como uma cidade onde algo novo começava a acontecer, inclusive politicamente, pois – através da UNIMEP e da administração municipal, que se tomaram intimamente unidas a partir de 1978 – criavam-se núcleos ostensivos de resistência democrática, de protestos, de desafios. Em 1977, o Presidente Geisel editava o “Pacote de Abril”, coincidindo com o inicio da administração de João Herrmann Neto, aumentando tensões e estimulando resistências. (Um acontecimento triste, naquele ano: morria Elvis Presley … ) Piracicaba transformava-se na Meca das esquerdas intelectuais de São Paulo, chamando a atenção de jornalistas, escritores, ativistas de movimentos democráticos, de políticos que passaram a se interessar pela “experiência socialista” em terras piracicabanas. Até juízes e promotores públicos simpatizavam com a causa, entre os quais se destacavam Urbano Ruiz e José Ribeiro Borges.

João Herrmann Neto não teve habilidade política, porém, para se comunicar e relacionar-se com as classes dirigentes e com as elites culturais de Piracicaba. Seu estilo personalista e, ao mesmo tempo, provocador, causava escândalos e desconfianças. Se buscava – através de seus secretários e com a sua própria presença – estabelecer diálogos e entendimentos com as lideranças de bairros, João Herrmann Neto se afastava da classe média e das elites, dos meios de comunicação social, dos políticos mais experientes, da “intelligentsia” piracicabana, estimulando o surgimento prematuro de outras em uma maneira de agir de verdadeira “terra arrasada”. E tinha mais: seu comportamento pessoal era de agressão e de menosprezo ao que Piracicaba tinha de conservador e, também, de sua história. A imagem era a de um “socialismo festivo”, irresponsável, inconseqüente – mas inequivocamente brilhante, renovador, transformador. Havia, finalmente, uma proposta política em Piracicaba, ainda que difusa e contraditória. Mas havia. João Herrmann Neto assumia uma indiscutível liderança popular, como que preenchendo o vazio deixado por Salgot Castillon. As classes populares – com o apoio de setores da Igreja Católica e da UNIMEP – passavam a ter voz. A partir de 1978, com a Conferência de Medellin, o episcopado latino-americano lançava, definitivamente, a “opção preferencial pelos pobres”. E os padres mergulhavam nessa opção, de maneira muitas vezes afoita, o que levou ao surgimento de fraturas ainda não calcificadas dentro da classe média. Eram muitos fatores conjugando-se ao mesmo tempo, estimulados pelo cansaço da ditadura militar, com a consciência cada vez mais clara de que seria inevitável o retomo ao exercício democrático.

João Herrmann Neto, porém, passou a ser o maior inimigo de si mesmo e de sua administração que, através de uma equipe reconhecidamente disposta a efetuar transformações, via as inabilidades, provocações gratuitas e imaturidade do Chefe do Executivo atingirem-na em sua credibilidade.

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