Greves perversas.

Houve tempo, neste país, em que se lutava pelo direito justo, democrático e universal à greve como recurso legítimo dos cidadãos. Era tal a tirania que greves chegaram a ser até mesmo atos heróicos, como aconteceu quando o então metalúrgico Lula surgiu no ABC, mobilizando os metalúrgicos. Era tal a opressão sobre os brasileiros que, em poucos dias, o sindicalista se transformou em herói nacional, com o apoio de intelectuais, da Igreja, de partidos políticos, do homem anônimo das ruas.

A redemocratização do Brasil nos trouxe, também, a chamada “Constituição Cidadã”, celebrada por Ulisses Guimarães – então líder político e presidente da Câmara Federal – como uma conquista que refletia a lucidez do povo brasileiro, norteados e orientados, a partir de então, do que se dizia ser uma das mais avançadas Cartas Magnas do mundo. Não foi bem assim. E não é. O próprio José Sarney, quando a fatalidade o levou à Presidência da República, após a morte de Tancredo Neves, confessou e assumiu: com tal Constituição era impossível governar. E os presidentes que vieram depois confirmam-no.

Quando, hoje, se fala em revisão e reforma constitucional, os mais afoitos ou de má fé insistem em lembrar de quarteladas, de golpes, até mesmo tentando fazer comparações com essa verdadeira revolução que acontece na Venezuela, onde Chavez, apesar do berreiro de alguns, está impondo uma outra estrutura jurídica àquele país, a que dá o nome de “socialismo bolivariano”. Ninguém sabe o que irá acontecer, nem se funcionará. Mas os pensadores e analistas de boa fé sabem que nada tem a ver com o Brasil, com a real necessidade de se revisar a constituição, de proceder-se a reformas urgentes, como a reforma política, tributária, educacional, tantas outras.

E as greves perversas que se repetem no país fortalecem as convicções de que a “Constituição Cidadã”, se se preocupou mesmo com o cidadão, o fez mais em nível grupal e individual, menos como coletividade e como nação. Escancarou-se de tal forma o direito à greve que foram acolhidas, também, as greves infames, perversas, essas que, em nome do direito de uma que outra categoria, prejudica o povo, causa sofrimentos coletivos e, também, a morte. Uma greve de médicos não pode ter espaço num país que se diga civilizado. Nem de metroviários, nos transportes públicos, nem em nada que paralise ou prejudique o essencial da vida coletiva.

O que acontece em Alagoas, com pessoas morrendo por greves infames, é próprio de lutas tribais, não de conflitos de direitos. E, quando se fala que a Saúde está em dificuldades, com falta de verbas e com orçamentos ineficientes, é preciso lembrar que os maiores escândalos deste país tem acontecido especialmente, nos últimos anos, no Ministério da Saúde, com vampiros, sanguessugas e máfias da ambulância, cujos rastros chegaram a Piracicaba. Eis aí, pois, uma boa luta para o “Cansei!” da OAB: contra greves infames e a favor de uma devassa no Ministério da Saúde, não apenas diante do que ocorre agora, mas anteriormente também a Lula.

E não nos esqueçamos nunca de quem um dos sentidos mais profundos de corrupção é perversão. Greves perversas, pois, são greves também corruptas, com a deterioração do direito e da justiça.

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