Começar de novo…
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O que é que muitos de nós faríamos, se nos fosse dada a chance de viver de novo a nossa vida? Parece fazer mais sentido perguntar a quem já viveu, pelo menos, meio século. Do alto de 50 respeitáveis anos, é permitido olhar para trás e cofiar o queixo. Passar a mão no cabelo. Tirar uma lasca de unha. Suspirar. Deixar correr uma lágrima.
Mas para um jovem que deu um mergulho num lago, bateu a cabeça numa pedra e ficou paraplégico, a pergunta também caberia. Se ele pudesse viver novamente a sua vida, naquele momento do salto, ele não teria pulado, sem antes indagar a alguém da vizinhança se havia pedras no fundo.
Quando se é jovem, não se faz esta pergunta a ninguém: há pedras no fundo deste lago? O corpo quer mais é viver a aventura da água e da graça. Diante da tragédia que prostrou o corpo, qualquer suposição posterior lacera a carne e a alma. Ah, se eu pudesse voltar atrás!… Se eu pudesse!… Se alguém tivesse me avisado!…
Contudo, chega-se a um ponto onde resta-nos olhar pelo retrovisor da vida e o que está feito, está feito. Para uns, são colhidas glórias sobre glórias; para outros, dores, perdas, lutas, sofrimento. Seria a vida injusta e desigual? Mas há um céu que nos protege.
Ah, meu Deus, e a nós, pobres mortais, o que imaginar? De minha parte, será que teria feito exatamente as mesmas coisas, cruzado com as mesmas pessoas ao longo do caminho? Não creio em script pronto. Não. Cada um escreve a sua história. Cada um tem o livre arbítrio para agir de acordo com sua vontade e inteligência.
Não sei se minha vida teria tomado outro rumo, se tivesse ido para São Paulo estudar jornalismo, na minha primeira faculdade. Teria sido eu uma jornalista de renome? Estaria hoje, quem sabe,trabalhando na tevê? Só pensamos numa carreira glamourosa. Ninguém quer o anonimato, o arroz com feijão do dia-a-dia modorrento e sem graça, digitando anúncios ou revisando as colunas das celebridades. Todos querem seus 15 minutos de fama que, dizem, estão virando 15 segundos…
Talvez fizesse o curso de desenho, sempre tão protelado! Poderia ter cursado Psicologia em vez de Pedagogia. Também Filosofia, meu sonho até hoje. Ah, eu não teria abandonado o tratamento para a coluna, ainda antes da primeira cirurgia. Possivelmente, tentaria morar um tempo numa beira de praia para saber como é. Tanta coisa…
Nos anos 70, as pessoas ainda noivavam e casavam. Constituí família, construí um lar maravilhoso e fui felicíssima no casamento. Levei muito a sério aquele “até que a morte nos separe”, pois só assim nos separamos.
Suponho, enfim, que se pudesse viver novamente a minha vida, teria ousado um pouco mais, conforme nos pedia um professor na faculdade: “Por favor, ousem!”. Mas, o que fiz está feito e, como propôs Borges, creio que, se não dei muitas voltas a pé no meu quarteirão, contemplando as flores e as pessoas, quem sabe ainda dá tempo?
E você, caro leitor, se pudesse novamente viver a sua vida, o que você faria?