Flor de Plástico
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Diz o ditado que vale mais um vizinho perto que um irmão distante. Se sua casa pegar fogo ou você passar mal pode até adiantar alguma coisa ligar para o seu amigo ou irmão há quilômetros de distância, mas, quem vai socorrer você a tempo certamente será seu vizinho. Se você mantém com ele um bom relacionamento melhor ainda; não precisa nem gritar. Porém, muitos buscam longe o que se encontra perto.
É certo que intimidade demais acaba mal. Ninguém gosta de invasão de privacidade; e bom humor nem sempre está disponível. Porém, brigar com o vizinho é tiro no pé. Às vezes é preciso elevadas doses de paciência e tolerância para manter um relacionamento positivo ou mesmo formal; mas vale a pena. Contudo, um bom vizinho é preciso fazê-lo. Mas depois de cativado vira inestimável tesouro. Mesmo assim, é bom não esquecer o que disse Carl Sandburg, poeta e historiador estadunidense (1878-1967): “Ame seu vizinho assim como você ama a si mesmo, mas não derrube a cerca”.
Falando nisso, você já observou que por aonde se vá tem gente com a cara enfiada no celular? Seu mundo está ali. Dormem com ele. É a droga do momento. Alguns – especialmente doentes afetivos – ficam tão dependentes que demandam tratamento. Capaz que a água potável se acabe sem que percebam. Não dão a menor satisfação aos que estão a sua volta e aos problemas que afetam a vida; cumprimentar nem pensar. Alguns largam você no ar para atender chamadas que nada têm a dizer. Os com fone de ouvido com aquela fiozera pelo pescoço, parecem fugitivos de UTI.
Grosso modo falando, essa gente ainda não se atinou para a importância das relações. A falta de senso os impede de ver que se precisarem de informações ou de socorro urgentes vão depender dos que os cercam; ou mesmo se sentirem atacados por inesperada caganaeira terão que no mínimo perguntar aos que estão perto onde fica o banheiro mais próximo. Se isso acontecer, bem feito.
Contudo, dos males o menor. Pior de tudo é perder oportunidades e não curtir o desafio de fazer novos amigos; e o mundo sem eles vira um deserto, disse alguém. O isolamento dessa gente é tanto que nem conversar sabe. Aliás, quem deles sustenta um papo cabeça por mais de cinco minutos? Na busca por borboletas pisam as flores. Pelo telefone tentam dar e receber carinho, atenção e calor. Porém é tudo virtual. Por mais que se fale e explique, nunca parece suficiente para se fazer entender. Na verdade, faltam olho no olho, mão na mão; ternura no rosto e o calor do abraço.
Um gesto, um sorriso ou choro podem expressar melhor o que milhares de palavras não conseguem, pois não somos só ouvidos ou razão; somos também sentimento. Tem gente que já incorporou esse modo insosso de se relacionar e até prefere. Existem pais que diante dos filhos parecem múmias. Falam o que querem falar pelo celular. O inverso também procede. Pela rede brigam, se agridem, pedem perdão e declaram amor. Cara a cara a coisa é diferente. Evitam contato, afeto, compromisso e envolvimento, pois sabem de suas dívidas, consigo e com que rodeiam.
Lembro-me do quintal de casa tomado por flores de vários tipos que minha mãe cultivava com carinho, paciência e dedicação. Os quintais com bananeiras, mangueiras, goiabeiras e galinheiros eram nosso mundo. Hoje concretaram tudo para as crianças não se sujarem e derrubaram fruteiras porque preferem frutas sem gosto do supermercado. Ergueram muros para não serem perturbados. Mães nem desafogar um nenê conseguem; não têm tempo para botar os filhos no colo; não sabem costurar e nem fazer um bolo; compram pão cheio de conservantes, comidas prontas e não conhecem os filhos que pariram. Por isso, ‘cuidam’ deles pelo celular, contratam bufês para fazer festa e enfeitam a casa com flores de plástico.
São mães virtuais. Entendeu porque os filhos são assim?