Quaresma Eleitoral

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Se para os católicos a quaresma é um tempo de revisão pessoal e comunitária em preparação para a vida nova que requer a Ressurreição, para o cidadão comprometido o tempo da campanha política deveria ter o mesmo efeito.

As eleições para prefeito e vereador são as mais importantes porque é na cidade que realizamos nossa história e é o governo municipal que diretamente interfere na nossa qualidade de vida. Nosso interesse ou omissão fazem a cidade melhor ou pior.

As eleições deveriam ser o coroamento de um período de reflexão, avaliação, questionamentos e de novos propósitos. Bom seria se todos os cidadãos – das crianças aos idosos – vivessem ativamente esse tempo refletindo sobre a cidade que estamos construindo; se é a das relações humanas sustentáveis e inclusivas ou a das empreiteiras, da concorrência e do salve-se-quem-mpuder.

Cada cidadão deveria questionar seu modo individualista de viver e, em vez de erguer muros, abrir-se à comunidade, porque se não houver entre nós camaradagem e respeito, acabaremos construindo um inferno, e não há governo que resolva isso. Os bairros deveriam se reunir com suas organizações para avaliar seu trato diário, levantar seus problemas e oferecer proposituras de políticas públicas voltadas às necessidades da sadia convivência humana. Nesse mesmo sentido as indústrias, os sindicatos, as igrejas, as escolas, os comerciantes, a imprensa, as organizações, etc. deveriam se perguntar como têm retribuído à cidade que os acolhe e à terra que lhes dá sustento.

A campanha eleitoral teria que ser um tempo de aprendizado da democracia; de debate sobre deveres e direitos; de busca coletiva por novos caminhos e de sabatina intensa dos que almejam cargos públicos. Estamos longe disso, mesmo porque não há muito que esperar de uma sociedade cujas instituições estão tomadas por pessoas incapazes de corresponder aos profundos anseios que os novos tempos exigem; muito menos de um povo que se maravilha com os coelhos que os mágicos da administração pública tiram da cartola.

Em vez de planos estratégicos que atuem nas causas apontadas por diagnósticos precisos, os candidatos – principalmente o da administração que se encerra – apresentam uma lista de remendos. Para a violência, mais polícia; para a doença, mais médicos; para mobilidade mais avenidas; para educação mais escolas; para habitação mais sorteios, e por aí vão a reboque dos fatos. Essa mentalidade personalista, imediatista e inócua de governar é extremamente onerosa, pois sustenta uma roda imensa de interesses e interesseiros. Pregam o desenvolvimento econômico porque sem dinheiro não sabem governar. Vemos na História países arrasados por catástrofes se reerguerem graças à riqueza interior das pessoas como a resiliência, fraternidade e a compaixão. Estamos fartos de crescimento. Desenvolvimento é que precisamos.

Lamentavelmente as campanhas eleitorais têm sido um desperdício de tempo e dinheiro com aventureiros e oportunistas; candidatos sem lastro, laranjas de políticos aferrados ao poder e curingas de grupos devoradores da coisa pública. Em vez de chorar rimos do deboche que fazem da sagrada arte da política. Conhecer todos os candidatos e suas propostas, e interagir com eles; para isso serve a campanha. Contudo, terminado tão dispendioso processo o eleitor continua na mesma. Se a televisão pode levar os candidatos à casa de todos, por que não usá-la melhor? É justo um mais tempo de exposição que outro? Do jeito que está quem tem mais dinheiro, poderosos padrinhos ou domina a máquina acaba se (re) elegendo, enquanto candidatos bem intencionados ralam para convencer as pessoas sobre suas legítimas intenções.

Isso é democracia ou lei do mais forte?

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