A grande questão

pictureAo contrário do que deveria ser, poucas de nossas realidades tornaram-se tão pequenas quanto campanhas eleitorais. E, novamente, nas eleições que se encerraram, em primeiro e segundo turnos. Em política, o importante tornou-se o resultado, tendo o poder como fim. Esse fim – o voto e o poder – justificou os meios, todos eles, incluindo ilícitos e imorais. À ciência e arte do bem comum, política fez-se teatro de simulação e dissimulação. Políticos simulam o que não são. E dissimulam o que realmente são.

A imoralidade das campanhas se acelera a cada eleição, multiplica-se, expande-se. Se todos os meios valem, perdeu-se, também, o real significado de eleição e do voto. Vota-se para quê? O candidato é meio ou fim? E o eleitor? E o voto? Quem é o verdadeiro sujeito da dinâmica democrática, qual o fim? E quando políticos falam em ética – dissociando-a da moral – a que ética eles se referem? Ora, ética e moral são quase sinônimos, pois que, de uma maneira ou outra, situam-se no universo dos costumes. Pode, assim, alguém “ser ético” como candidato e agir de forma imoral quando no poder? Quando indefinidas, ética e moral tornam-se simples falácias.

Uma das questões cruciais da humanidade – agora agravadas com situações inéditas diante de novas descobertas e técnicas, ainda mais com a crise econômica mundial – é encontrar o chão sólido do comportamento humano. Já se fala, cada vez com mais insistência, em uma “democracia ética”, partindo-se do princípio universal de que a moral é decidida pelo próprio povo, algo que vem das funduras da alma coletiva. E o princípio que o move é, por assim dizer, eterno, o mesmo que se tornou fundante de religiões e culturas. É a capacidade humana de ver-se a si mesmo no outro. E, nas relações entre os homens, conseguir respeitar “o outro como eu mesmo”. É a base do direito, da justiça, das civilizações solidárias. Portanto, o outro jamais poderá ser considerado um meio, algo que se instrumentaliza. O outro é um fim. Também ou especialmente na política. Sem esse entendimento e tornada elástica a consciência moral, instala-se a desordem.

Ora, o mundo – abalado por nova e grave crise – não tem outro caminho senão o da retomada de valores, ao encontro dessa democracia ética. Se parece impossível o advento de uma moral universal, é inquestionável haver raízes comuns que permitem o diálogo entre civilizações, entre mundos de culturas diferentes, como o ocidental e oriental. E, especialmente, entre pessoas de uma mesma comunidade, mesmo que entre grupos discordantes. Há valores que unem e aproximam mesmo os que estão separados.

Se se busca, pois, uma democracia ética, muito mais urgente e necessário é instalar essa moralidade na política, poder tentacular que influi na economia, na ciência, até mesmo na consciência humana. Por isso, há que se lamentar, novamente, a inconsciência e irresponsabilidade de partidos políticos acolhendo e abrigando candidatos que não tem sequer consciência da responsabilidade como princípio moral e de ética. Como pode alguém falar em responsabilidade social se lhe falta lucidez? Como pode manifestar-se em questões vitais para a comunidade, se não tem a mínima capacidade de compreender, de entender? E, por outro lado, de que adianta ter diplomas e competência, ser doutor e experiente, se não tiver o fundamental ético, que é o outro, o ser humano como fim, jamais como meio?

Qual candidato nos tratou, em todo o país, cidadãos e pessoas como fim e sujeito das eleições? E quem os viu apenas como eleitores, simples votantes? É a grande questão que justifica medos, receios e cansaços, explicando também a assustadora abstenção de leitores nas última eleições. Bom dia.

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