Dia da Mulher e Carnaval.

Destino e bruxas produzem, em mim, as mesmas reações: não acredito neles, mas sei que existem. Ainda agora, quanto a destino, fico perdido num novelo de dúvidas e de incertezas. Jung fala de “coincidências significativas” e estas me levam a, pelo menos, pensar em sinais da vida, dos tempos, do mundo. Que há sinais, lá isso há. Que exigem, no entanto, olhos de ver e coração de sentir. Por outro lado, a minha é alma árabe e, portanto, a que olha estrelas à espera de desvendar o que está escrito nelas. É o “macktub”.

Aprendi a refletir mais seriamente diante do que parece simples coincidência. Afinal de contas, “há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia”, não é verdade? Vai daí, fico pensando na contribuição – que deveríamos, suponho eu, aproveitarmos como reflexão – de o Dia da mulher ter caído numa Terça Feira de Carnaval, a chamada Terça Feira Gorda. Seria castigo, advertência, simples coincidência? Mais sábios seríamos, acredito eu, se pensássemos em advertência e em reflexões. Pois o universo feminino – tão esplêndido, rico, generoso – entrou em conturbação e parece estar em busca de uma saída.

Ora, lá se vão mais de 40 anos de quando o “Women´s Liberation” – movimento libertador da mulher à época – deflagrou o que seria o estopim para a explosão do chamado feminismo no mundo todo, que se tornou erroneamente conhecido como a “Queima dos sutiãs”. Não houve sutãs queimados, mas eles foram depositados no chão, em frente ao hotel onde se realizaria o concurso de “Miss América”, em Atlantic City. Mulheres fartaram-se de ser vistas, apresentadas, tidas como meros objetos sexuais. E foram à luta, em busca de direitos que lhes serão negados, de injustiças cometidas.

E a luta feminina teve êxitos admiráveis, conquistas esplêndidas, ainda que haja muito para se reequacionar. No entanto, ao lado de exércitos formidáveis de mulheres que dão testemunho admirável de trabalho, de inteligência, de participação, de luta, existem, cada vez mais e melancolicamente, outros verdadeiros e tristes exércitos. O de mulheres que fazem, agora, questão de usar o corpo, a sexualidade, a atração física para conquistarem espaços que muito poucas vezes se revestem de alguma forma de nobreza. Aí estão televisão, revistas pornográficas, shows, espetáculos, toda uma indústria do entretenimento reduzindo mulheres a um nível baixíssimo de dignidade e de respeito. E pior ainda: com o consentimento e assentimento, com a concordância e aplauso de uma multidão feminina cada vez mais crescente.

A conquista feminina esbarra, penso eu, não apenas em restrições culturais, em tabus milenares, em um conservantismo masculino quase doentio. Esbarra em sua própria gênese, num conflito que ainda não foi solucionado: mulheres que se masculinizam, como se, para disputar com o homem, tivessem que se tornar machonas; mulheres que aceitaram e gostam de ser usadas como objeto de propaganda, usáveis e abusáveis sexualmente, disponíveis para um universo hedonista que se vai tornando caótico.

Dia da mulher numa terça-feira de Carnaval não representa, evidentemente, a dignidade feminina, a nobreza da sua missão na terra, seu insubstituível papel no mundo. Mas deveria servir, sim, de reflexão como uma coincidência que deveria induzir, novamente, as verdadeiras lideranças femininas a uma reação contra a vulgaridade, a banalização, essa prostituição oculta que se faz em relação ao feminino. Nem tanto Maria, mas nem tanto Eva. Pois, na verdade, o mundo está pedindo socorro à própria mulher. O homem, no comando e na orientação da vida, fracassou. É a quarta-feira de cinzas do masculino. Mas há mulheres, ainda, em pleno Carnaval. Bom dia.

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