Diálogo fecundo

picturePreciso ter mais cuidado com o que escrevo e falo, pois a linguagem, hoje, está cada vez mais diferente. Com os jovens e adolescentes, incluindo netos meus, a conversa emperra, não caminha, não sai do lugar.

Ora – falta-me, apenas, retomar pouco da prática – mas sei a linguagem de surdos-mudos, em especial o abecedário. Se jornal fosse ao vivo, eu mostraria como se faz a letra A em língua surda-muda. Pode parecer quase igual ao OK dos gringos, mas não é. Parecido com OK é o B na linguagem surdo-murdeza.

Em vez de linguagem de surdos-mudos, ando tentando o MSN. Para netos, escrevo: “Bs.” E coloco umas figurinhas bonitinhas, que aprendi a selecionar no programa. Idoso eu o sou, admito-o; mas não velho. Idoso é antigo e antiguidade vale muito no mercado, especialmente para novo rico que, não sabendo mais o que comprar, vai a antiquário em busca de novidade. Ou seja: antigo é novo. No velho é que está o problema. Coisa velha, por não ter mais utilidade e não funcionar, joga-se fora. Museus e antiquários estão em alta. Dizem, até, que o mulherio, em relação ao sexo oposto, tem preferido os mais antigos com um argumento insuperável: “múmia não dá trabalho. Basta formol.”

Isso posto, posso, com humildade, dizer que tento adaptar-me a esses tempos ditos e chamados de tecnológicos. Parêntese: todos os tempos são, a seu modo, movidos pela tecnologia. A invenção do urinol foi conquista avançadíssima para a época. Portanto, eu, que andei de carroção de boi e de bonde, não posso estranhar a internet. O sonho humano se realiza conforme a tecnologia disponível.

Antes, namorava-se por cartas, havendo até contratos feitos ultramarinamente: escrevia-se o pedido em papel de carta, enviava-se pelo próximo navio que, por sua vez, demorava dois anos para chegar ao destino. E, uns três anos depois, vinha a resposta: “Vou pensar.” Portanto, namorar e amar pela internet têm apenas uma vantagem em relação a namoros virtuais de antigamente: diminuiu o tempo e aproximou espaços.

Por falar nisso – e eis-me com outro parêntese – estou diante de uma crise pessoal perigosa, sei lá se existencial ou apenas filosófica. Tenho dois amigos em cidade vizinha que resolveram namorar pela internet. Ela, feliz da vida por estar viúva; ele, infeliz, separado. Moram no mesmo prédio de apartamentos, encontram-se no elevador, na sala de televisão, na área de lazer. Olham-se, cumprimentam-se, sorriem e combinam: “Daqui a pouco, estou na internet e a gente conversa, tá?” A viúva fica toda excitada, aguardando o encontro e o caduco do meu amigo, em estado de graça. E eu, aturdido.

Há poucos dias, conversei com um dos meus netos . Foi um diálogo fecundo, comunicante, de pessoas comunicativas:

Avô: Meu neto querido, amado do coração. Que saudade! Como vai sua vida? E a escola? Está namorando?

Neto (meneando a cabeça) : Hmmm, hmmm

Avô: Que bom, meu anjo. Vovô fica feliz de saber que está tudo bem. E sua namorada, é loura ou morena?

Neto (afirmativo) – Hmmmm.

Avô : Que bonitinha, lourinha que nem sua vovó? Tem olhos azuis?

Neto: (rindo) Hmmmm…

Avô: Ah, entendi. Ela é moreninha e tem olhos verdes, não é?

Neto: (feliz.) Hmmmm…

Avô: Tá vendo como o vovô é inteligente?

Neto: (sacudindo os ombros.) – Hmmmm…

Desisti. Sei que o garoto irá dar-me um abraço, mandará recado amoroso pelo MSN:

– Tb, vô. Naum fq chateado. Bj. Rssss

A comunicação humana é dom divino. Bom dia.

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