Estar cético

CéticoCerta vez, um garotinho de 11 anos perguntou-me alguma coisa e, de repente, lá estava eu desandando a falar do desânimo que as coisas acabam dando na gente. Aquilo que ele me perguntava era o que eu também perguntava aos meus nove, dez anos. Angústias gerias: a fome, a seca do Nordeste, a miséria das pessoas, o desencanto com políticos, as injustiças, a corrupção. São coisas que não mais se dimensionam e, por isso, não saberia dizer se eram piores antes ou agora.

Tenho a impressão de que tudo piorou, mesmo porque o povo foi, a pouco e pouco, perdendo o espírito de solidariedade, noções e valores cívicos. Falar de civismo é arriscar-se a ser vaiado.

E lá fui eu falando, talvez mais para mim mesmo do que para o garoto. Pois, no fundo, sobra uma angústia terrível, uma decepção sem nome. Fico pensando em que minha vida se vai indo e eu não cheguei a ver esse país, o meu país, ajustar-se, tornar-se sério pelo menos. As coisas deterioraram. Antes, havia fome, mas uma fome que se poderia dizer digna. Os próprios pedintes, que sempre existiram, mostravam uma dignidade interior que não havia sido atingida.

Agora, são milhões, espalhados pelo país todo. E o futuro? Aí é que está. Antigamente, falava-se em futuro, com muita esperança. Hoje, não se fala mais, como se o túnel se tivesse tornado tão longo que não se encontra nem sinal de luz ao fundo dele.

Descubro, então, que, desagradecidamente, perdi o otimista irrecuperável que fui. Sei que, algum dia, esse país encontrará o seu destino. Mas me parece tão longe e distante esse dia, que me dá tristeza de constatar que estou vendo a vida passar e não consegui ver aquilo que, de tanta esperança, quase tinha sido uma certeza. Dói, porque acredito numa vida terrena única oportunidade de se estar por aqui. Então, a tristeza aumenta: nascer uma única vez e ter nascido num país destrambelhado.

Não, não me tornei um pessimista, pelo fato de o otimismo ter-se ido embora. Tornei-me um cético. E isso é ainda pior, talvez. O pessimista vê as coisas com olhos negros. O cético descrê delas. O pessimista acha que as coisas irão piorar. O cético até disso duvida. Dá uma tristeza sem tamanho e sem nome. Ver que lá se foram 50 anos e até mesmo os hábitos de simples civilidade se deterioraram. Que dizer, então, de uma civilização brasileira. Ainda bem que apenas estou cético, não sou cético. Mesmo porque acabei descobrindo, não sei se certa ou erroneamente, que as coisas verdadeiras e mais bonitas não estão no exterior, mas no interior das pessoas. Construir esse mundo interior é mais difícil do que construir uma nação. Mas é mais recompensador e jubiloso. Bom dia.

Deixe uma resposta