Inadequado para menores

Não há mais qualquer comentário a fazer a respeito da classe política brasileira, começando de Brasília até o mais desconhecido dos grotões deste país. A corrupção tornou-se pandêmica e a falta de vergonha, numa proporção nunca vista. Pois o que acontece no Congresso Nacional – o Senado conseguindo igualar-se à Câmara dos Deputados – é, ainda outra vez, o palco mais iluminado para se revelar a miséria da consciência cívica brasileira. E, nessa miséria, inclua-se, também, o próprio povo, miserável culturalmente, miserável educacionalmente, miserável em sua impotência diante de grupos indecorosos que usam do poder público para interesses pessoais ou corporativos.

Nada mais há a falar, pois os fatos falaram por si mesmo e a televisão – que tanto os políticos quiseram como meio fácil de se mostrarem para o povo – desnudou a desfaçatez, a falta de pudor, o nível rasteiro em que se encontram algumas das principais lideranças políticas brasileiras. E ainda mais vergonhosamente: são os homens de Brasília que se transformam em paradigmas e pontos de referência para os intelectualmente indigentes aprendizes de feiticeiro que se espalham pelos interiores do Brasil.

Não há mais saída, pois nem mesmo as próximas eleições poderão depurar ou higienizar a estrutura política brasileira, pois a enfermidade se prova estrutural, nada tendo de conjuntural. Há uma rede de contatos, um emaranhado de fios apodrecidos que se estendem de Brasília aos municípios, destes a Brasília. Ou há quem tenha, ainda, a doce e santa ingenuidade de acreditar seja diferente o panorama nas assembléias legislativas e câmaras municipais, a não ser as proporções? Se, para exemplificar, um vereador tem seus vencimentos e privilégios de conformidade e proporcionalmente aos parlamentares federais, por que haveriam, esses homens sem grandes luzes, querer que as coisas modifiquem? E os partidos políticos, ainda com seus coronéis e caciques, até mesmo em cidades interioranas, entre as quais Piracicaba , politicamente, se destaca como uma das mais medíocres?

As próximas eleições não mudarão nada, mesmo que se mudem pessoas. Pois é o organismo federativo que se deteriorou e o Congresso Nacional está em estado terminal e comatoso. O mais lastimável, agora, penso eu, é o comportamento claramente parcial da chamada grande imprensa, que peneira o noticiário, como que ignorando a presença da televisão que a tudo mostra e revela. No caso da última xingação vulgar e vergonhosa no Senado, tendo como protagonistas Renan Calheiros e Tasso Jereissati, a imprensa tem tentado mostrar apenas Renan Calheiros como o grande vilão, quando, na verdade, ninguém escapou. E, para o mundo ver, foi Tasso Jereissati quem cometeu a primeira grande e imperdoável grosseria, quando, sem ter o direito de fazê-lo, gritou, de sua cadeira senatorial: “Não aponte esses seus dedos sujos para mim”. Foi atitude de quem está acostumado, em grandes parcelas do infelicitado Nordeste brasileiro, dar ordens com o chicote nas mãos, o coronel todo poderosos que arrotou o seu poder econômico, “o jatinho é meu, com o meu dinheiro.” Se é dele, se tem dinheiro para comprar e bancar despesas, por que surrupiou as passagens, pagas pelo povo, para uso próprio?

De Renan Calheiros, nada mais há a falar. E, quanto a José Sarney, não haja mais dúvidas: sairá, dessa lama toda, como um mártir, pois, sobre ele, estão – em especial a imprensa – lançando a culpa por todo a podridão. E Sarney nada mais é do que parte dessa podridão toda. Afinal de contas, por que PSDB e seus aliados se escandalizam em punição para Arthur Virgílio, o mercurial político nortista que é réu confesso de corrupção? Ou, diante dos cofres da nação, basta confessar a esperteza e devolver em parcelas o dinheiro da malandragem? A moralidade do PSDB está cada vez mais tosca.

O fato é que ninguém mais escapa. Incluindo Eduardo Suplicy, que, com cara de santo do pau oco, já encheu a paciência da nação com suas infantilidades que lembram a Peterpan. Não há saída. Mas uma providência o Ministério Público poderia adotar, em benefício de crianças e adolescentes: que as tevês da Câmara e do Senado, das assembléias legislativas e de câmaras municipais coloquem o aviso de “programa inadequado para menores.” E bom dia.

Deixe uma resposta