Circo sem pão

A beleza de ser jovem está, penso eu, em sentir-se um deus em cada oportunidade. Deus dos céus, deus de trovões, deus do amor, deus do sexo – a deliciosa certeza de ser capaz de tudo. Especialmente, capaz de transformar e mudar o mundo. À sua própria maneira, em cada dia que amanhece. Lembro-me da minha frustração de adolescente quando, ao amanhecer, descobria terem, os adultos, destruído o mundo que nós – moços e em mesas de bar – havíamos construído na noite anterior. Era incompreensível: por que  destruíam, os adultos,  mundos tão justos, bonitos, amoráveis que construíramos  ao sabor de copos e mais copos de Cuba Libre?

O jovem é capaz de viver, por inteiro, a Utopia.  Mesmo porque a utopia juvenil constrói-se em partes, por partes. Ora conserta-se a moral cotidiana, ora a economia; ora a política, ora as religiões; ora o conceito familiar, ora a ordem social. Era assim que, aos poucos, construíamos o apaixonante nosso e novo mundo. Assim, as novas gerações deveriam sonhar novamente. Mesmo sabendo que, na manhã seguinte, a utopia será pisada pela realidade dos adultos, essa gente idiota que, por ter crescido, troca sonhos por pesadelos. Tendo saudade depois.

Mas não importa o que foi feito. Sonhar é preciso. Especialmente agora.  Pois, no caos do viver, os mais idosos fazem, da saudade, o sonho de antes. E o mais acalentado:  “um cantinho e você, uma rede ao luar…”   É a agônica ironia da vida: quando se pode fazer, não se quer; quando se quer, já não se pode.  Somos vítimas de ensinamentos conflituosos.  Por exemplo:  “não deixe  para amanhã o que se pode fazer hoje”. Mas,  “amanhã, será outro dia”. E, então: faço hoje ou deixo para amanhã? E la nave va…

Hoje, eu defenderia – e muito –  a filosofia dos poderosos de Roma: “panem et circenses” – e eis um povo alegre, sem revolta e indignação. “Pão e circo”, uma urgência para a  humanidade.  A Copa do Mundo está provando como o circo é fundamental para os povos. Mas o circo vai embora. E fica a pergunta crucial: cadê o pão? Há quem saiba onde está: são as apenas seis (6) pessoas que detêm a riqueza  equivalente ao ganho de mais de três(3)  BILHÕES de outros humanos.  Séculos , quantos,  serão necessários para resolver tal infâmia?

Tomara,  após o adorável circo,  os jovens nos contagiem com a utopia de dar, aos  miseráveis,  pelo menos o pão. Enquanto ensinamos  “não dê o peixe, ensine a pescar”,  milhões, biliões de seres humanos vivem a maldição da fome, da doença, da infâmia. A hora atual é a de socorrer.  Não há que se falar  em miserável  se não se entender a misericórdia. “Miser”, eis o antepositivo de ambas as palavras.  Miserável é o infeliz, que  mal sobrevive.  Misericórdia é o sentimento de compaixão para com o miserável. É  dar o pão.

Justiça vem depois. Para quem sobreviver.

 

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