“In Extremis” (190) – A Seleção é mesmo brasileira?

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(imagem: pesquisa Google)

Ah! tristeza que dói no peito. Cadê a paixão? E aquele fervor que parecia quase religioso, cadê? Onde ficaram a expectativa, a tensão, o nervosismo, a esperança? É mesmo verdade – ou outra trapaça – que a Seleção, lá no deserto de Catar, seja brasileira? Por que não mais consigo entusiasmar-me, fazer minhas mandingas em cada jogo, sentir o coração bater com mais força?

Sim, sou apaixonado por futebol. E, até mesmo fanático quando se trata do Corinthians; assim como, também, pelo XV, até que uma diretoria permitiu fosse a camisa alvinegra trocada pela tricolor do São Paulo. Mais do que traição, foi prostituição. Doeu tanto que nem quero me lembrar.

E a Seleção Brasileira, quanta agonia, mas tanta alegria! Recordo-me com detalhes da tragédia de 1950, quando perdemos em pleno Maracanã. Eu, junto com meu pai, ouvíamos o jogo final através de um grande rádio de válvula. Mas o Uruguai venceu. E meu pai deu um murro tão violento na mesa da cozinha que, por muitos anos depois, a família contava que ele precisou consertá-la. Em1954, na Suíça, ainda não deu certo. A recordação é radialistas precisarem trocar o nome de Pinga, o craque do time. Pois, para os suíços, a palavra Pinga era um palavrão. E perdemos também.

Ser campeão do mundo de futebol tornou-se obsessão nacional. Mas, em 1958, dois meninos mudaram nossa história: Garrincha e Pelé. Eu estudava num cursinho em São Paulo e, num jogo classificatório, contra o País de Gales, os professores suspenderam as aulas. Foi desesperador. Então, o menino Pelé, ah! glorioso, quase divino Pelé, resolveu. Fomos campeões contra a Suécia, na Suécia. Foi uma festa inenarrável em todo o país. Comemorei na Avenida São João, com Ester, minha namoradinha paulistana.

Apaixonado, sim. Fanático também pela Seleção. Recordo-me até das grandes discussões que se faziam a cada convocação dos jogadores. O povo infernizava a vida dos técnicos para convocar atletas de seu time do coração.  Em 1950, a grande rebelião acontecera porque Flávio Costa, o técnico, escalara Friaça no lugar de Cláudio, na ponta direita. E Chico, em vez de Rodrigues, na esquerda. Os brasileiros conhecíamos todos os jogadores. Eles faziam parte do cotidiano nacional. Eram “gente nossa”, guerreiros que saíam do Brasil para as grandes batalhas no exterior.

Em Piracicaba, que orgulho dos dois caipiracicabanos – De Sordi e Mazzola – Campeões do Mundo! Que loucura coletiva feita de orgulho e vaidade!  Em 1970, no México, nem preciso lembrar. Mas, em 1982, que tristeza! Era a mais completa das seleções, depois de Pelé. Eu estava no Mississipi, visitando parentes. E não sabia onde ver o jogo pela televisão até encontrar um boteco numa tarde de domingo. Entrei, angustiado. Havia apenas pessoas pretas. Olhavam-me com raiva. A intuição levou-me a ir embora. E o Brasil – para espanto do mundo – perdeu.

E agora… Quem são os jogadores convocados? Brasileiros ou apenas nascidos aqui? Parece-me uma legião estrangeira. O povo não participou de nada. E eu não consigo ter alguma identidade com a Seleção. Quem são eles? Sei serem outros os tempos, como dizem. Mas eu não sou desse tempo idiota. Apenas estou nele. Só não sei o nome de quase nenhum jogador. Parecem apenas convidados, não guerreiros. E isso é triste!

Mas já sei o que irá acontecer. Em 1970, juramos torcer contra o Brasil para enfrentar o ditador Médici. Besteira. Torcemos como malucos. Hoje, reclamo por reclamar. Pois já estou nervoso à espera do primeiro jogo da Seleção. Pra frente, Brasil! E que o resto do mundo se dane.

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