“In Extremis” (195) – 2023 e o eterno retorno

depositphotos_406178120-stock-photo-four-wooden-puzzle-metal-human

“Eu reconstruí o homem e, então, reconstruí o mundo.” (imagem: depositphotos)

Chegamos ao final de um ciclo vivido entre ódios, ranços, divisionismos e, acima de tudo, de idiotices. O Brasil foi contaminado. E não há como negar tenham sido anos de conflitos, de premeditada tentativa de destruir valores consagrados. Ficamos divididos. E irracionalmente. Pois foram jogadas às traças realidades fundamentais para o convívio social e o respeito às divergências.

Há promessas de outras mudanças. E, com elas, expectativas ainda tímidas em nome de esperanças. Pois houve muito sofrimento e decepções. E o futuro de milhões de jovens e crianças já está comprometido. Logo, urge a retomada do caminho interrompido, o reinício, o retorno. Não se trata de retrocesso. Retornar é retomar, rever equívocos e erros, recomeçar. Ora, o que são o mundo e a vida senão esse eterno retorno? A noite retorna ao dia; o inverno retorna à primavera; o “bom filho à casa retorna”. Por que, então, não retornarmos àquilo que parece perdido ou do qual nos afastamos por tantos equívocos?

Não se trata de ir-se em busca de hábitos e de costumes passados. Na realidade, o que se exige de nós nada mais é do que profundas e graves reflexões sobre a nova realidade em que vivemos. Seria irresponsabilidade negar tenha, o Brasil, ficado à margem dessa outra caminhada humana. O governo que termina negou-se a entender a revolução que as técnicas trouxeram, provocando mudanças radicais em praticamente todos os setores da convivência humana. Tanto assim foi que, numa falácia medíocre, insistiu na falsa probabilidade do advento de um superado comunismo, que abalaria, portanto, um também superado capitalismo. Não se fala mais nisso. O que sobrou deve ser identificado como um necro-capitalismo ou um necro-comunismo. Logo, já mumificados.

O retorno exigido é para a sobrevivência comum. As nossas ruas estão coalhadas de seres humanos desabrigados. Milhões de pessoas passam fome num país que está entre os primeiros exportadores de alimentos do mundo. A gravíssima questão do desemprego não tem sido estudada com a profundidade exigida. Como, onde empregar a multidão de jovens sem acesso às novas realidades e exigências do universo virtual? Quanto tempo isso demandaria, mesmo se – como agora volta a se prometer – colocando a educação como prioridade? Até lá, o que se fazer?

Ora, o que fazer! Uma pequenina historieta consegue revelar-nos como a complexidade, para ser enfrentada, tem iniciativa simples. Um pai, tentando dar lições de vida ao jovem filho, rasgou em diversos pedaços uma folha de papel representando um mapa mundi. Desafiou o garoto: “Olha aí, eu destruí o mundo. Quero ver se você consegue reconstruí-lo.” Rapidamente, o menino juntou os pedaços e reorganizou o mundo destruído. Espantado, o pai quis saber do segredo. E o garoto explicou: “Por trás da folha, havia a figura de um homem. Eu reconstruí o homem e, então, reconstruí o mundo.”

No entanto, a insensatez humana levou-nos a querer conquistar outros planetas. Profetas, pastores prometem e anunciam uma nova vida em um outro mundo. E fazem, da miséria e das provações, virtudes alcançar algum paraíso. A grande e sublime orientação, no entanto, já nos foi dada até muito antes de Cristo: “o outro”. Somos interdependentes. Por mais poderosa seja a pessoa, por mais rica, por mais sábia – ela sempre dependerá de outras. Não há “eu” sem o “outro”. E isso exige um mínimo de respeito mútuo, de solidariedade.

2023 cobra, de nós, o retorno à coexistência inteligente. Se não por consciência, pelo menos para sobrevivermos. À beira do precipício, recua-se.

Para acompanhar outras crônicas desta série, acesse a TAG “In Extremis”.

Deixe uma resposta